segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Maracatu Nação Pernambuco

Belíssimo clipe do Maracatu Nação Pernambuco. É uma colagem de momentos de suas apresentações com vários trechos de músicas, poesias, que os brincantes desta nação interpretam com grande beleza.

Vou me embora dessa terra
Para outra terra eu vou
Sei que aqui eu sou querido
Mas não sei se lá eu sou
O que eu tenho pra levar
É a saudade desse chão
Minha força, meu batuque
Herança da minha nação
(Trecho da letra de Olodumaré -Antônio Nóbrega)
...

Olinda vou navegar
Na dança do mar, do teu mar
Se eu te perder nesse cais
Para obiará
...
Foi essa dança que fez tremer Casa Caiada
Qual é essa dança, foi da Ribeira até Escada
Eu vim de Holanda pra Olinda
Eu naveguei no caminho das Índias
(Trechos de letras de Domínio Publico)

domingo, 30 de dezembro de 2007

Excelente 2008

Pessoal, neste ano de 2007, nossa conversa foi boa, no próximo 2008 será excelente.
Tudo de bom para todos que frequentaram e contribuiram com suas colaborações e informações para que nosso blogzine fique cada vez melhor.

Abraços do Zeca Zines!

Ednardo - Dono dos Teus Olhos / Kalu

Dono dos Teus Olhos
Humberto Teixeira

Não te esqueças que eu sou dono dos teus olhos
Faz favor de não "espiar" pra mais ninguém
Esse azul cor de promessa dos teus olhos
Faz qualquer cristão gostar de "tu" também
Que Nosso Senhor perdoe os meus ciúmes
Quando eu penso em cegar os olhos teus
Pra que eu, somente eu seja o teu guia
Os olhos dos teus olhos
A luz dos olhos teus


--- --- --- --- --- ---
Kalu
Humberto Teixeira

Kalu, Kalu
Tira o verde desses "zói de riba d'eu"
Kalu, Kalu
Não me diga que você já se esqueceu
Kalu, Kalu
Esse olhar depois do que "assucedeu"
Com certeza só não tendo coração
Fazer tal judiação
Você tá "mangando de eu"

Nota: Na música Kalu, Ednardo atualiza sua leitura, modificando a letra inicial:
Colocando "diga" em vez de "tente". E "certeza" em vez de "franqueza".
O que dá outra leitura interessante.

Ednardo - A Manga Rosa

A Manga Rosa
Ednardo

A manga rosa
Maria Rosa
Rosa Maria Joana
Peitos gostosos
Rosados doces
Rosados doces, mama, mama mamãe
Teu sumo escorre da minha boca
Entre-aberta porta
Por onde entra, por onde sai
Por onde entra e sai o mundo
Mundo

Balança a fronde
Farta mangueira
E mata a fome, morto a fome
Ou mata, imensa massa, imensa massa
Florados cachos de verde amarelou
Maduro fruto que pro nosso gozo vem
Amem, amem, amem, amem
Mamem, mamem, mamem, mamem
Ámem, ámem, ámem, ámem

Ednardo - É Cara de Pau


É Cara de Pau
Ednardo / Brandão

É cara de pau
E você acha que eu posso fazer
Fazer mais do que eu fiz
Ajudei essa louca a viver
E ela mesma é quem diz
Que quer me ver frito
Que quer me ver morto
Estendido no chão - eu não

Puz o bagulho do lado
Quebrei o estrado e toquei fogo no colchão
A gente se amarra, aconselha os pivetes
Faz até oração
Porém chega um dia
Que se fuma uma bia
E também se faz a nossa confusão
Ora tenha paciência
Quer me ver andar duro
E com toda decência
Mas em são consciência
Qualquer malandro manja
Essa falsa inocência

Ednardo - Ingazeiras




Ingazeiras
Ednardo

Nasci pela Ingazeiras
Criado no ôco do mundo
Meus sonhos descendo ladeiras
Varando cancelas
Abrindo porteiras
Sem ter o espanto da morte
Nem do ronco do trovão

O sul a sorte a estrada me seduz
É ouro, é pó, é ouro em pó que reluz


Ednardo - Longarinas


Longarinas
Ednardo

Faz muito tempo que eu não vejo o verde daquele mar quebrar
Nas longarinas da ponte velha que ainda não caiu
Faz muito tempo que eu não vejo o branco da espuma espirrar
Naquelas pedras com a sua eterna briga com o mar

Uma a uma as coisas vão sumindo
Uma a uma se desminlinguindo
Só eu e a ponte velha teimam resistindo
A nova jangada de vela
Pintada de verde e encarnado
O meu mote não muda
A moda não muda nada

O mar engolindo lindo
A antiga praia de Iracema
Os olhos grandes da menina
Lendo os meus mais novos poemas
A lua viu desconfiada
A noiva do sol com mais um supermercado
Era uma vez meu castelo entre mangueiras e jasmins florados

Beira Mar, ê, ê Beira Mar ...

Ê maninha, arma aquela rêde branca
Arma aquela rêde branca...

Que eu vou chegando agora

Ednardo - Lagoa de Aluá

Lagoa de Aluá
Ednardo / Climério / Vicente Lopes

Uma lagoa nasceu dentro do meu peito
Pra de noitinha vir a lua espiar
O meu amor mergulhando dentro dela
Nadando nela sem o cabelo se molhar
Como é bonito ver o meu amor nadar
Nessa lagoa que nasceu dentro de mim
Depois notar que de tanto se banhar
Meu amor virou saudade e saiu no meu cantar
Se essa lagoa fosse um copo de aluá
Eu bebia dentro dela até me maravilhar

E hoje em dia se me lembro da lagoa
Sinto que a lua está morando no meu peito
E o seu clarão é a luz do seu amor
Que depois que me encandeia
Faz a luz do meu olhar
E vejo claro que a lagoa que não vejo
É o gosto desse beijo que não posso mais beijar

Ednardo - Está Escrito / Versos de Violeiros e Cordelistas

Está Escrito
Ednardo

Está escrito
No grande livro da sabedoria popular
Que primeiro se deve viver
Que é pra depois poetar

Se arme de amor e coragem
Que a minh'arma eu nunca embainho
Se arme de amor e coragem
Como a rosa se arma no espinho
Na tragédia, poesia, na prosa
Tem picada feroz e carinho
Se arme de amor e coragem
Que a minh'arma eu nunca embainho

- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Versos de Violeiros e Cordelistas
D.P.

Mana pegue na viola
Que eu quero ver seu talento
Sendo de metal eu quebro,
Sendo de bronze impromento
Sendo de aço eu envergo,
Sendo de ferro eu 'rebento

Menina você é minha
Suceda o que assuceder
Aquilo que o povo diz
Foi ou é ou há de ser
Pois menina quando mija
E faz um buraco no chão
É sinal que já tem força
No bico do gavião

Sou raio estou faiscando
Sou peçonha de serpente
Sou furacão na nascente
Sou pedra infernal queimando
Sou dez navalhas cortando
Devora sem ver a quem
Dos poetas que aqui tem
O que for de mais conceito
Eu pegando ele à meu jeito
Ou quebra, ou papoca, ou vem

Cachaça bicha danada
Cachaça bicha gostosa
Quantas vezes bebi dela
E caí pela calçada
Com a boca bem aberta
E a barriga espichada
Sendo alvo do aperreio
Do povo e da meninada
Pois a gente bebe tanto
Nessa terra do Brasil
Que até o nosso mapa
Já tem forma de funil

Avoa meu caboré
Penera meu gavião
Avoa meu caboré
Penera meu gavião
Palmatória quebra dedo
Palmatória faz vergão
Palmatória quebra dedo
Palmatória faz vergão
Quebra osso amassa carne
Só não quebra opinião

sábado, 22 de dezembro de 2007

Mário Quintana - Vamos falar de poesia...


"Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas.
Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha,
nem desconfia que se acha conosco desde o início das eras.
Pensa que está somente afogando problemas dele, João Silva...
Ele está é bebendo a milenar inquietação do mundo!"


Se eu fosse um padre
(Mário Quintana)
Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
— muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,
não citaria santos e profetas: nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,
Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!
Porque a poesia purifica a alma...e um belo poema
— ainda que de Deus se aparte
—um belo poema sempre leva a Deus!
Texto extraído do livro "Nova Antologia Poética", Editora Globo - São Paulo, 1998, pág. 105.


sábado, 8 de dezembro de 2007

Alfa Beta Ação

ALFA BETA AÇÃO
EDNARDO

Aquele mestre ensina justamente aquilo
Que não me interessa saber
Esquece de dizer - meninos nossa sina é saber viver
Impõe, implora, impera e vocifera
É que ele tem a vara de condão
Da educação, da conformação, da transformação, a revolução
É que são tantos verbos de persuadir
De sujeitar o sujeito a não existir
É que são tantos objetos indiretos
Condicionais do porvir

Na hora do recreio
Vamos todos soletrar bê-a-bá, bê-ipsilon - Baby
Luz del Fuego, marginal canção de amor, grito primal
Namorar por trás do muro do vestibular
Cruzar palavras, mocidade, inventos
No passo da ema, a volta da jurema, peneiro ê, iê, iê

Erguer a cabeça fora do pânico total
Telegrafar aos amigos da geral - PT saudações
É bom que você não se torne um marionete falante
De sexo, grafite e poesia
Política, som atuante, meditação, anarquia
Com a mesma filosofia de quem acha a vida pronta
No fim do novo ABC há o clarão da Bomba Z

Estrela e lua crescente, quero navegar inteiramente
Pela tua geografia escrever colorido
A palavra proibida
Vida, vida, vida, vida, vida
Vida, vida, vida, vida
Vida, vida, vida,

________________________

Análise de Duda Matta Silveira
Salvador / Bahia
(copia de post na comunidade orkut de Ednardo http://www.orkut.com/CommTopics.aspx?cmm=128653 )

Alfa Beta Ação... acho essa uma das mais sensacionais canções do inigualável Ednardo.
Sua letra é de uma profundidade e alcance abissais. Acho que ela vai muito além de ser "apenas" uma crítica ao ensino em salas de aula.
Na verdade, acho que ele critica a forma acadêmica de ver o mundo, critica também os valores passados e ensinados por todos os meios de informação e formação dos seres humanos, englobados aí professores, políticos, jornalistas, escritores, etc.

Claro que ele usa a metáfora da escola para passar sua mensagem, mas vejam que a música começa e termina com a exaltação da "palavra proibida": VIDA.
É a exaltação da escola da vida e da própria vida como a lição que realmente importa. Viver bem, ser feliz e livre. Viver, experimentar, sentir.

A letra também pode ser vista como um hino à liberdade e uma rebeldia contra as amarras e os conceitos dos regimes militares da época, utilizando a metáfora do ensino para tanto. Vejam o que ele fala do "velho mestre":
"Impõe, implora, impera e vocifera
É que ele tem a vara de condão
Da transformação, da conformação, da educação, da revolução
É que são tantos verbos de persuadir
De sujeitar o sujeito a não existir
É que são tantos objetos indiretos
Condicionais do porvir"
Quem é que tem a vara de condão da transformação, da conformação, da revolução e que busca persuadir e sujeitar as pessoas a não existirem? E quem condiciona o futuro (porvir)?
Sim, o Governo, as instituições públicas e a mídia. E tb a educação.
Depois, ele conclama todos a soltarem seu grito primal na hora do recreio (no intervalo da lavagem cerebral) e colocarem a cabeça para fora do lamaçal. Ousarem, inventarem, deixarem de ser marionetes falantes.
Assim, ele cria uma metáfora absurdamente genial da educação num sentido muito mais amplo de liberdade, senso crítico, romper padrões pré-estabelecidos. E termina usando a geografia para escrever a vida a cores.
É linda de chorar.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Música no Curriculum Escolar

Excelente notícia!
Música no Curriculum Escolar. Começam a acordar pra esta necessidade básica que deve vir desde o início da escolaridade aos cursos médios e continuar nas universidades como especialização, tanto na área popular quanto erudita.

A música, alimento do espírito, do intelecto, do exercício da sensibilidade há muito tempo já devia ter sido expandida do mero palco da prática do pão e circo, do divertimento e lazer para tornar-se tão importante quanto o ensino das ciências exatas, experimentais, linguagens, informações e educações, físicas, religiosas, artes, tecnologias, etc.

Além do mais a música no currículo escolar começa a chamar atenção para uma depuração importante da qualidade do material criado pelas futuras gerações de músicos, compositores, autores, e professores que terão que se especializar em suas áreas.

Sem pretensão de ser didático, chamo atenção para exemplos básicos entre tantos outros que podemos citar, o que seria da longevidade dos Beatles sem George Martin, ou da Tropicália sem Rogério Duprat e Damiano Cozzella, maestros com embasamento de ensinamentos teóricos e práticos que forneceram grande riqueza às suas músicas.

Claro que isto não ofusca a criatividade original, o tônus vital de quem nasce com predicados próprios dos grandes artistas, mas é certo que abre outros horizontes para todos, tanto para os que realizam quanto para os que recebem o produto final.

Se esta medida tivesse vindo antes, talvez não tivéssemos o quadro dantesco da atualidade comandada apenas por interesses comerciais de departamentos de marketing e de mídia, mandando ver em grande parte o lixo musical para consumo, porque tanto os que comandam corporações do meio musical e mídia quanto o público seriam mais exigentes, teriam aprendido na escola que a música engloba quase tudo e é vital para o desenvolvimento humano como um todo.

Filosofia é de importância fundamental, é outra matéria que deveria constar no curriculum escolar no ensino médio principalmente, porque no superior já existem faculdades específicas.

É claro que música no curriculum escolar, não deve se tornar coisa tipo no governo (ditadura) de Getúlio Vargas, forçando todo mundo aprender "Canto Orfeônico" pelo método de Villas-Lobo, que embora genial não deveria ser o único, nem no modelo do tempo de outra ditadura militar meados dos anos 60, década de 70 aos meados da década de 80, trabalhando ferozmente para “limpar a mesa” alijando quase que duas ou três gerações dos meios de comunicação de massa, na tentativa de apagar a história dos fatos, da cultura, enfim das músicas e letras feitas durante este período.

A diversidade de ensino da música nas escolas realmente não pode ter ranço de quaisquer espécie. Melhor que seja no universo da música mundial, com atenção especial ao nosso terreiro, às nossas diversidades musicais a nossa brasilidade em conjunto com outras formas de manifestações musicais.

Pelas músicas de todas as partes do mundo, além de aprendermos idiomas, poesia, comportamentos e identidades de um povo, é veículo de transporte de uma infinidade de pensamentos e atitudes e sacações de insights, que os matemáticos em suas precisões admiráveis chamam de "Universo Bi-Univoco", para traduzir e expressar um ambiente no qual podemos entender e falar sobre nosso mundo e existência e cultura, no sentido maior das palavras mais plenas de significados.

A economia que envolve o fato musical é uma forma mundialmente reconhecida de movimentação considerável de fatores de riqueza, (não falo apenas do monetário), que atualmente entra no funil de remessa de lucros e dividendos de via única, envolve também fatores de transformação e criação de domínios muitos abrangentes.

Que tal podermos ter a oportunidade de que se ensine a nossa gente a trabalhar desde novo com esta ferramenta?

Quando uma das músicas mais ricas do planeta não é capaz, ainda, de gerar reconhecimento de forma mundial, como uma das fontes mais plenas de movimentação de valores agregados, nem no exterior, nem em nosso próprio pais, é sinal que algo deve ser feito para colocá-la na perspectiva de atuar como fator de mudanças.

A preocupação de muitos é que professores mal informados ou pouco formados ou tendenciosos manipulem ou negligenciem o importante espaço.

Mas vejo também por outros prismas, todos eles amplos. Um povo bem informado de sua cultura e arte, ao se ver no espelho e se respeitar, e se reconhecer, deixa de repetir outros modelos e assume sua própria identidade.
Música nas escolas com professores bem formados e informados com visão ampla, é tudo de bom.
Desta forma, até eu queria voltar pra escola com Nova-Mente.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

O Direito do Autor no Mercado Digital

Zeca Zines aplaude Flávio Paiva, artigo que merece ser lido.
O original publicado em 08/11/2007, está no jornal Diário do Nordeste

Flávio Paiva - http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=485503


________________________________________________________________


A evolução tecnológica produziu as redes de computadores, as plataformas de comunicação com a transmissão em tempo real, facilidades de gravação e difusão de músicas, filmes, textos, imagens e jogos, e a prática do remix em novos modelos de negócios com base digital.

A oferta de vias de acesso à informação aumenta a todo instante no mundo da tecnologia e com ela cresce a necessidade de conteúdos para que os nodos econômicos do sistema de transmissão e de armazenamento de dados e informações se tornem cada vez mais competitivos e lucrativos.

A despeito dos interesses meramente mercadológicos da teia digital tem havido um esforço muito grande das nações para ocupar espaços na rede mundial de computadores com suas versões sobre aspectos históricos, culturais e científicos.

A geopolítica mundial passa pela trama da visibilidade entre o regional e o global. Concomitantes a isso se espalham dentro do próprio sistema os movimentos de luta pelo software livre e em favor de uma globalização não hegemônica.
É inegável que experiências de construção coletiva do conhecimento, a exemplo da Wilipedia, são muito interessantes, mas insuficientes e sempre vulneráveis a quem tem mais poder de postar informações.
Na interseção entre os conjuntos que tratam do mercado digital, dos espaços de autonomia dos povos e da democratização do acesso à informação é natural que ainda haja muito a ser percebido, aprendido e compreendido.

A questão do Direito Autoral é um dos pontos críticos nessa zona de cruzamento de potências, especialmente no que diz respeito ao mercado digital.
Os autores, já tão espoliados pela indústria cultural tradicional, passam a ser alvos do poder econômico multinacional e sua capacidade de produzir vulgatas capazes de conduzir seus interesses pelo subtexto dos discursos em favor da humanidade e dos valores universais.

A produção de conteúdos passou a ser um bem muito valioso na nova economia.
É o pau-brasil, a cana-de-açúcar e o ouro da era das navegações virtuais.
Assim como ocorreu no período da conquista dos mares, nessa caça ao tesouro, a primeira regra de disputa é a da disseminação do senso de desapropriação dos legítimos donos das fecundas terras a serem espoliadas, o que, no caso, são os autores.

Um dos argumentos para isso é o de que os bens culturais não se acabam ao serem consumidos, além de serem uma contribuição à expansão da cultura.
Assim, e falsamente em nome da sociedade do conhecimento, espalham que a propriedade intelectual é fator de restrição ao acesso das pessoas às produções nos campos literário, artístico e científico.

A novidade do momento é o Creative Commons que em si não é um mal, mas, enquanto prega deliberadamente uma socialização do conhecimento serve de escada para as transnacionais do mercado digital.
O discurso libertário do CC está subordinado à dinâmica do mercado de computadores, softwares, telefones, motores de busca e provedores de acesso à Internet.
É uma invencionice da mania norte-americana de resumir o mundo a um grande mercado.

Sua função no sistema é fornecer instrumentos legais que permitam o uso ´não comercial´ de obras, como tentativa de neutralizar a ´pirataria´, de instigar à população a cobrar dos autores que liberem gratuitamente seus trabalhos em nome do bem-comum e, por trás de tudo isso, facilitar que o comércio de conteúdos funcione sem que as empresas do mercado digital precisem pagar os autores.

Em termos jurídicos, a ação do Creative Commons não altera em nada os fundamentos do Direito Autoral, estabelecidos em tratados e convenções internacionais, segundo os quais são livres as cópias sem fins lucrativos, citações, notícias de imprensa, divulgação dos fatos e outros usos de obras autorais.
Como derivativo da nova ordem, o CC faz uma elucubração sobre si mesmo para promover uma confusão entre essência, forma e meio de transmissão.
Não podemos esquecer que a essência é humana (o amor, a dor, o encantamento...), a forma é o jeito subjetivo como o indivíduo reelabora a essência (composição, pintura, escultura...) e o meio é a via de escoamento das informações (plataformas físicas e virtuais), que pode ser de caráter público ou privado.

Ao acender luzes sobre a suposta causa da democratização dos conteúdos o Creative Commons o faz de uma maneira que ofusca ao invés de iluminar.

Ao dificultar o discernimento com relação ao direito inalienável dos autores esse tipo de organização da era digital põe sobre si interrogações quanto ao seu propósito.
Nunca é bom para a sociedade que o discernimento esteja comprometido com a crise.
E a crise atual não é de instrumentos legais, mas de controle da pilhagem e dos seqüestros de conteúdos por parte das corporações multinacionais que dominam o sistema digital e a Internet.

A mudança que está no ar é apenas na remodelação do poder econômico.
A estratégia da venda direta é o mais novo movimento do mercado global.
Chegar ao consumidor eliminando atravessadores é um incomparável diferencial competitivo.

Tem sido comum que artistas disponibilizem músicas gratuitas pela Internet a fim de vender shows, ganhar com festas, publicidade e produtos licenciados.
Muitos artistas da cultura de massa estão migrando da relação de negócios com as grandes gravadoras para assinar com empresas de eventos.

Até o jabá, que é uma contravenção instituída pela indústria fonográfica para massificar produtos musicais, deixa de servir apenas para vender CD e DVD para promover performance.
Nesses casos, sim, surgem questões objetivas que requerem aprofundamento quanto à maneira de remunerar os autores que não se apresentam e muitas vezes o público sequer sabe que existem.

Teriam os intérpretes e os produtores de eventos que destinar um percentual de seus ganhos para pagar os autores? No caso dos mercados informais a solução que tem sido apontada é a da taxação da mídia virgem, como forma de arrecadação e distribuição dos direitos autorais.

Caminhos como esses exigem todo um processo de reorganização do sistema de representação dos autores para que funcione com mais transparência e eficácia, sem concentração exagerada de privilégios nem igualitarismo inspirado em deficiências.

Com a expansão do sistema digital e da comunicação em rede a questão autoral ganhou novas complexidades. Passou a envolver num mesmo circuito os autores profissionais e os amadores, os que são consagrados e aqueles anônimos que veiculam suas produções, sejam elas obras de valor artístico-cultural ou simples diários.

Estar na rede, contudo, não quer dizer ser ouvido, lido ou visto, mas é uma probabilidade.
Não é à toa que o maior varredor de conteúdos desse mercado se chama Google.
Essa palavra quer dizer a centésima potência do número dez; ou seja, dez com cem zeros no final. É um número enorme que, no entanto, no menu infinito da web, não tem diferença de qualquer outro. A diferença continua fora da rede, na cultura de massa, na cultura popular e no sistema educacional.

O que a economia do mercado digital está tentando mesmo é fazer uma migração do entendimento do Direito Autoral, do seu caráter estético, vinculado ao criador, para a função utilitária da obra, associada ao direito comercial.

O padrão europeu de proteção ao criador, adotado no Brasil, possibilita que o autor participe mais intensamente dos ganhos econômicos decorrentes da exploração comercial ou institucional da sua obra.

O que a nova economia está tentando nos impor é o modelo anglo-saxão, que privilegia o mercado, representado pelo direito de cópia (copyright), no qual o patrimônio do autor é assumido acintosamente pelas corporações.

www.flaviopaiva.com.br

flaviopaiva@fortalnet.com.br

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Chorinho e Cachaça: Estes Eruditos Populares


Esta semana ganhei de presente de aniversário o álbum duplo “Ao Jacob, seus Bandolins” lançado em 2003 belissimamente pelo Biscoito Fino, certamente um dos selos musicais mais importantes do Brasil e que conta com a fina-flor da MPB em seu catálogo.

O álbum, cujo projeto foi idealizado por Hermínio Bello de Carvalho e produzido por Luiz Otávio Braga e Pedro Aragão é dividido em duas partes: o primeiro disco possui 15 faixas gravadas ao vivo em dezembro de 2002 na Sala Cecília Meireles, no Rio de Janeiro, e traz a releitura de vários choros do mestre bem como músicas de Pixinguinha (Cheguei) e Radamés Gnattali (Suíte Retratos) que tiveram interpretações magistrais realizadas por Jacob em 1955 e 1964, respectivamente. Outras pérolas de Jacob compõem o disco a exemplo de “Doce de Coco”, “Benzinho”, “Assanhado”, “Noites Cariocas”. Participaram do concerto vários músicos de primeira linha, entre eles Joel Nascimento, Maurício Carrilho, Yamandú Costa, Armandinho, Zé da Velha, Altamiro Carrilho, entre outros.


Na última faixa, “Noites Cariocas”, utilizando-se técnicas de re-mixagem foi possível que Jacob “tocasse” com os referidos músicos em versão emocionante. Já o segundo disco foi gravado entre janeiro de março de 2003 nos estúdios do Biscoito Fino e conta com a participação, entre outros, de Joyce, Guinga, Zé Renato, Nilze Carvalho, Olívia Hime, Francis Hime e Mauro Senise.


Algumas faixas foram acrescidas de letras como “Noites Cariocas”, “Benzinho” (Hermínio Bello de Carvalho), “Falta-me Você” (Geraldo Carneiro), “Meu Lamento” (Ataufo Alves) e “Bola Preta” (Aldir Blanc). Este álbum, aquisição obrigatória para aqueles que gostam de música de verdade, descansa em minha coleção ao lado de outros mestres do chorinho como Altamiro Carrilho, Waldir Azevedo e Joel Nascimento.


O chorinho é uma das músicas mais intrigantes que conheço. Embora tenha em seu contexto um extremo apelo popular e com a cara do Brasil e, mais especificamente, do Rio de Janeiro, sua execução é para poucos.
O virtuosismo musical que se exige do chorão talvez seja maior que a do jazz; seja por conta das complicadas estruturas das partituras, seja pela velocidade com que o instrumento é tocado. É difícil imaginar músicos maravilhosos como Herbie Mann, John McLaughlin, Al di Meola, Chick Corea e Joe Farrell tocando “Assanhado”, “Brasileirinho”, “Urubu Malandro”. Mestre da música erudita, o flautista Jean-Pierre Rampal, de quem tive o prazer de assistir a um concerto no Teatro Castro Alves em Salvador pouco antes de sua morte em 2000, certa vez disse ao Sivuca que no mundo havia os flautistas e o Altamiro Carrilho.

Lembro de uma entrevista do Altamiro à TV em que ele relatava que ao final de um show seu nos Estados Unidos, Miles Davis o procurou parabenizando-o pelo improviso típico do Jazz. Ante ao gênio incrédulo o chorão disse não se tratar nem de Jazz nem de improviso, pois era chorinho e todos os acordes estavam nas partituras. Portanto, o chorinho é a mais popular “música erudita” do mundo, pois está com um pé no terreiro de chão batido do samba e nos palcos de cedro da música clássica.


Sim, e daí?, O que tem a ver o chorinho com a cachaça. Pode perguntar o querido leitor. A isto respondo: tudo!!!
A partir do século XVI, a cachaça, da mesma forma que se fazia com os restos da fermentação do suco da uva, começou a ser destilada com a ajuda de um alambique. Seu primeiro nome foi aguardente de cana e ela era dada aos escravos junto com a primeira refeição do dia para que pudessem suportar melhor o trabalho nos canaviais.

Com o passar do tempo, o processo para a obtenção desta aguardente foi melhorando, assim como sua qualidade. Seu consumo cresceu de maneira tão rápida que a Coroa Portuguesa viu perigar a venda de sua aguardente nacional, a "bagaceira", para as colônias.
Em 1635, a metrópole acabou proibindo a venda de cachaça no estado da Bahia e, quatro anos depois, tentou proibir sua fabricação. No entanto, a cachaça já tinha se tornada a bebida preferida no então Brasil-colônia.
Ainda assim, por ser mais barata que outras bebidas, inclusive da cerveja, a cachaça sempre foi mais consumida pela classe mais humilde da população brasileira. Embora não seja especialista no assunto, posso arriscar a dizer que a cachaça se sofisticou nos últimos 20 ou 30 anos chegando a uma qualidade tal que a põe como um item importante de exportação havendo marcas da bebidas mais caras que muito uísque de 12 anos.
Posso não ser especialista em cachaça, mas sou um grande apreciador das boas marcas e, como tal, possuo um ritual para saborear esta bebida tão brasileira.

Tomar (a boa) cachaça requer extrema formalidade: sentir o aroma profundamente, utilizar taça apropriada e delicada, degustar lentamente apreciando o sabor. Realmente é uma grande emoção, talvez com mesmo rigor (de amador, obviamente) com que se aprecia um bom vinho.
É necessário momento especial, apreciação e sensibilidade.

Da mesma forma que o vinho, não se deve tomar cachaça em grandes quantidades e, muito menos, misturá-la com nada (claro, as cachaças mais delicadas, porque ninguém pode menosprezar a caipirinha, mas para isto há marcas de cachaça de menor delicadeza).
Nos momentos especiais em que aprecio esta riqueza nacional fico a me admirar: como pode ser tão popular e tão “erudita” ao mesmo tempo?

Pois é, mesmo com apelo tão popular muitas marcas de cachaça necessitam de “virtuosismo” para serem fabricadas e mais ainda para serem apreciadas. Da mesma forma que o chorinho, a cachaça possuí um pé no chão e outro no cedro. E se você sentar para tomar uma boa cachaça ouvindo “Pedacinho de Céu” de Waldir Azevedo chegará à conclusão de que nada mais brasileiro que chorinho e cachaça. Tão populares e tão eruditos ao mesmo tempo.


Antonio Inácio dos Santos Júnior

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Cinema Novíssimo






No título de Capa - Cinema Novíssimo (Revista Veja Rio - 23 fevereiro 2005), mostra uma nova geração que à margem do circuitão, lança centenas de filmes e lota salas de exibição em mostras e festivais.
Na matéria da revista, seis páginas inteiras com a manchete “Cinema é a Maior Diversão”, assinada por Pedro Tinoco e Rogério Durst, consta que realmente algo de novo acontece nesta nova geração do cinema carioca.

E assim descreve - ... “O burburinho na porta do Centro Cultural Banco do Brasil, era anormal para uma segunda feira... Lá dentro 400 pessoas a maior parte em torno dos 20 e 30 anos, ocuparam o foyer para assistir à cerimônia de inauguração da quarta Mostra do Filme Livre, exibindo 250 títulos realizados por diretores de quem você possivelmente nunca ouviu falar. A mostra é uma das pontas vistosas de um fenômeno.
Uma jovem multidão no Rio está realizando filmes, curtas na enorme maioria incentivada por acontecimentos como a retomada do cinema brasileiro e a propagação da tecnologia digital, mais barata e acessível.
E vem exibindo essa produção, às centenas, em eventos como a Mostra do Filme Livre, A Organização, o Cachaça Cinema Clube, o Atacadão de Filmes, o festival Curta Cinema, e outros mais. Todos com impressionante, e festiva, freqüência de público... Lúcia Rocha, mãe do Cineasta Glauber Rocha, chama atenção – Essa garotada é maravilhosa. Eles são o cinema novíssimo...

________________________________

Box – Talvez por isto, para explicar o fenômeno, a Veja faz o link com o chamado Cinema Novo dos tempos e templos de Glauber Rocha e tantos outros cineastas brasileiros que merecem o maior respeito.

Zeca Zines lança olhar amplo, e percebe que independente dos ensinamentos de todos os mestres que antecedem esta moçada, maior parte deles têm focos realmente diferentes e amplificam suas visões de imagens e sons em um caleidoscópio admirável.

Na foto de capa da Revista Veja estão: Julia Limaverde, Samir Abujamra, Pedro Lobito, Karen Barros, Débora Butruce, Guilherme Whitaker, Christian Caselli e Lis Kogan, mas existem muitos outros nomes...

Julia Limaverde é atriz, fotógrafa, roteirista e diretora e vêm atuando junto a estes vários grupos do novíssimo olhar do cinema brasileiro.
Trabalhou em curtas e longas-metragem, em seriados de TV, filmes publicitários, documentários, clips musicais e mostras de cinema.

Curta a seguir um dos filmes – 2012, feitos por Julia Limaverde, Katxerê Medina, João Oliveira, Renata Than, Fábio Assuf.

Zeca Zines aplaude a todos estes jovens cineastas, com entusiasmo!!!

domingo, 4 de novembro de 2007

2012





2012 - VideoArte que ganhou o prêmio de Melhor Filme na categoria Tema Livre do Festival do Minuto 2007 . Realizado pelo grupo de jovens cineastas do Coletivo Vivo:
Julia Limaverde, Katxerê Medina, João Oliveira, Renata Than, Fábio Assuf.

O filme curtíssimo de 1 minuto, é denso e contém itens de profecias do Calendário Maya e Nostradamus em relação à atualidade. É sintético e sincrético, juntando poesia ao ato, evidenciando a relação inconsequente do homem sobre o planeta Terra.

Este tema sobre o ano de 2012 vem atualmente ganhando destaque sob vários aspectos tanto em vídeos quanto nos assuntos relacionados ao mesmo.


quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Cio da Terra - 25 Anos




De 31 Outubro até 10 de Novembro 2007, em Caxias do Sul/RS, estão sendo realizadas as comemorações relacionadas aos 25 anos do evento Cio da Terra, 1º Encontro da Juventude Gaúcha, que reuniu cerca de 30 mil pessoas.

Em 1982, a organização do Cio da Terra ficou por conta da União Estadual dos Estudantes (UEE), em parceria com a prefeitura de Caxias, Universidade de Caxias do Sul (UCS) e Fenauva – Turismo e Empreendimentos, sendo considerado como um dos maiores eventos culturais deste tipo. Durante os três dias do encontro, as pessoas conviveram em um clima de debates culturais, apresentações artísticas e apostaram na valorização das propostas alternativas. Tinha cinema, teatro, música, literatura, debates, oficinas, e muito mais.

Zeca Zines vê semelhanças e identidades de abrangências, entre os eventos inaugurais e seminais da Massafeira Livre, realizada em Fortaleza em 1979 e 1980; o Encontro da Juventude Mineira realizado em 1981, e o Cio da Terra realizado em Caxias do Sul em 1982.
Cada um destes eventos, expõe e ressalta características próprias de cada região, e reune multidão de pessoas de todas idades em um palco/platéia aberto às expressão de todos, às premências da "juventude" de diversas faixas etárias querendo se expressar, após abafado período de silêncios impostos pela ditadura.
Nos debates que aconteceram no Cio da Terra, assim como nos outros eventos, tinham vários itens: Música, Teatro, Cinema, Dança, Literatura, Poesia, Artes Plásticas, Cultura Popular, Cultura Alternativa, Folclore, Artezanato, Comidas Típicas etc. No Cio da Terra os debates foram ampliados incluindo temas sobre Ecologia, Educação, TV, Negros, Indios, Mulheres, Alimentação Natural, Camping, Drogas, Política, Sexualidade, etc.
É uma comemoração que merece importância de registro. A programação consta de exposição de 100 (cem) fotos, cartazes, ingressos, material promocional da época, depoimentos e curiosidades, além de shows e exibição de filmes sobre o evento marco para a cultura gaúcha e brasileira.

Outras informações na comunidade orkut – Cio da Terra http://www.orkut.com/CommTopics.aspx?cmm=5820198

_________________________________________
Box -
Na área da música, vários artistas se apresentaram no palco do Cio da Terra, entre os quais Ednardo, Geraldo Azevedo, Sivuca, Jorge Mautner, Saracura, Engenho, Cenair Maicá, Régis e Rogério, Nei Lisboa, Bebeto Alves, Premeditando o Breque (Premê), Tarancon, Os Tapes, As Ninphas, Nelson Coelho de Castro, entre muitos outros.
Em entrevista concedida por Ednardo à Revista Void On Line # 17 de Caxias do Sul/RS, à jornalista Camila Borghetti - Julho 2006 http://www.avoid.com.br/ destaco trechos enviados pela Aura Edições Musicais:
______________________________
O Cio da Terra foi um grande encontro, seja na visão realista ou surrealista, tudo muito legal e pleno de harmonia. Quantidade enorme de gente, nos três dias estavam ali, num frio enorme... escutando e fazendo músicas. Grande parte era moçada, mas tinha gente de todas tribos e idades.
Mesmo que todos não soubessem ou tivessem exata consciência da importância daquele acontecimento, sentíamos que nós todos ali estávamos fazendo um evento muito grande...
Acho lindo o cartaz do Cio da Terra com a inteligente observação - Feito por Nossas Próprias Mãos. Porque na verdade foi isto mesmo.
A mais revolucionária das atividades humanas - amor e consciência, sem guerra, repressões, ou separações... pensando nos tempos de hoje, é tudo que todos sempre queremos.
E ali, nós vimos junto com a moçada do Rio Grande do Sul, em Caxias do Sul, e de vários Brasis, se concretizar, num tempo talvez ainda impossível, quase saindo da ditadura militar, mas que força magnífica demonstrada por todos. A música brasileira com certeza ganhou mais força durante este período.
Passeamos entre barracas do imenso acampamento e vimos muita gente linda, que nos convidava pra cantar um pouco e escutar suas músicas, tomar chimarrão, vinho, rolava em alguns cantos, charos dos bons, mas não vi nenhum desbunde de coisas pesadas, a juventude estava ali para mostrar que sabia se organizar por conta própria, e podia ser dona de seu próprio nariz, algumas pessoas nuas saiam das barracas para tomar sol, e casais em suas barracas fazendo amor, mas tudo natural e sem problemas e afetações...
Quando comecei a cantar o dia estava quase amanhecendo e foi um som e visual maravilhoso, eu já tinha tomado do generoso vinho do Rio Grande e o frio, pra mim, havia passado, tanto que cantei de camiseta, uma calça de algodão fina e pés descalços, enquanto todas pessoas do público e músicos, estavam super agasalhadas, foi inesquecível o momento, com grande importância pra mim, e acredito que também pras pessoas que assistiram ao show...
No mais recente show que fiz em Porto Alegre, em 2001, após apresentação, vieram conversar comigo muitas pessoas se referindo que estavam presentes no Cio da Terra, entre elas chegou um casal com um filho de 19 pra 20 anos, dizendo que foi gerado no Cio da Terra, no dia do meu show, e eles colocaram o nome do filho - Ednardo, fiquei super honrado e feliz com este fato, que representa que minhas músicas fazem parte afetiva da trilha sonora e existencial de muitas pessoas...

sábado, 27 de outubro de 2007

Edith Piaf - L'hymne A L'amour - Hino ao Amor

Edith Piaf cantando Hino ao Amor, canção consagrada pela artista em todo o mundo.

L'hymne à l'Amour

Marguerite Monnot / Edith Piaf

Le ciel bleu sur nous peut s'effondrer
Et la terre peut bien s'écrouler
Peu m'importe si tu m'aimes
Je me fous du monde entier
Tant qu'l'amour inond'ra mes matins
Tant que mon corps frémira sous tes mains
Peu m'importe les problèmes
Mon amour puisque tu m'aimes
J'irais jusqu'au bout du monde
Je me ferais teindre en blonde
Si tu me le demandais
J'irais décrocher la lune
J'irais voler la fortune
Si tu me le demandais
Je renierais ma patrie
Je renierais mes amis
Si tu me le demandais
On peut bien rire de moi
Je ferais n'importe quoi
Si tu me le demandais
Si un jour la vie t'arrache à moi
Si tu meurs que tu sois loin de moi
Peu m'importe si tu m'aimes
Car moi je mourrais aussi
Nous aurons pour nous l'éternité
Dans le bleu de toute l'immensité
Dans le ciel plus de problèmes
Mon amour crois-tu qu'on s'aime
Dieu réunit ceux qui s'aiment.

Paroles: Edith Piaf (1915 - 1963)
Musique: Marguerite Monnot 1949

Edith Piaf – Non, Je ne Regrette Rien

Piaf - Um Hino ao Amor
Edith Piaf – Non, Je ne Regrette Rien. Canção francesa escrita em 1956 por Charles Dumont e Michel Vaucaire, que ficou mundialmente conhecida através da gravação da grande intérprete Edith Piaf em 10 Novembro 1960.
As cenas são do filme Piaf - Um Hino ao Amor, que retrata seu sucesso e muitos problemas pelos quais passou. De saúde frágil, ela foi abandonada ainda pequena pela mãe, uma cantora, e criada pela avó em um bordel. Quando já estava se acostumando com a vida que levava, foi levada pelo pai, um contorcionista, para segui-lo em exibições de circo. Não demorou muito para que descobrissem seu talento na música.
Dos 3 aos 7 anos de idade fica cega, recuperando-se milagrosamente. Aos 15 anos, Edith segue inconscientemente os passos da mãe, cantando nas ruas em troca de moedas. Porém, sua experiência adquirida nas apresentações com seu pai e nos cabarés que freqüentou, permite que sua voz chame a atenção de todos os que a escutam.
Ela consolida sua carreira, mas não de uma forma fácil. Sempre enfrentando problemas com vícios e dramas pessoais. Isto não impede que Edith Piaf se torne uma das maiores cantoras de todos os tempos.
Piaf - Um Hino ao Amor conta a história real da intérprete de canções como La Vie en Rose e Non, Je Ne Regrette Rien.
O filme nasceu quando o diretor Oliver Dahan viu foto da juventude de Edith e percebeu que quase ninguém sabia nada sobre essa época de sua vida. Devido a inúmeros problemas, como o envolvimento com cafetões ou suspeita de assassinato, ela raramente falava sobre antes de se tornar a famosa Edith Piaf. O sobrenome artístico recebeu por seu tamanho, 1,42 m. Piaf, em francês, é pardal.
É um dos grandes filmes biográficos. Marion Cotillard, atriz que interpreta Edith, demonstra talento incrível. Conta ainda com o grande ator Gérard Depardieu. Título Original: La Môme - 2007.
O roteiro de Isabelle Sobelman e Olivier Dahan é extremamente original e as emoções saem de todos os lados. Edith Piaf para muitos é provavelmente o maior ícone da cultura francesa. http://youtu.be/4Hqc-NWlNJQ

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Sêca D'água - Patativa do Assaré - Interpretação coletiva





Este projeto nasceu quando o nordeste do Brasil estava vivenciando uma "Sêca" inversa, em vez da falta de água era uma enchente que inundava toda região.
Muitos artistas se reuniram para falar e cantar, pegaram o mote da Letra de Patativa do Assaré - Sêca D'água" e desenvolveram em duas músicas coletivas, cantadas por muitos artistas brasileiros.
Entre os quais: Chico Buarque, Gilberto Gil, Ednardo, Fagner, Belchior, Elba Ramalho, Amelinha, Luiz Gonzaga, MPB 4, Roberto Ribeiro, Alcione, João Nogueira, Paulinho da Viola, Olivia Bynton, Ivan Lins, Elza Soares, Luiz Carlos da Vila, Terezinha de Jesus, Tania Alves, Carlinhos Vergueiro, Beth Carvalho, Rosemary, Mauro Duarte, Bebeto, Telma, Sílvio César, Marlene, Erasmo Carlos, Miucha, Cristina Hollanda, Gonzaguinha e muitos outros.
Na faixa Chega de Mágoa - presentes Tim Maia, Maria Betânia, Roberto Carlos, Gal Costa, Tom Jobim, Wagner Tiso, e muitos outros ilustres.

Gravação realizada no Multistudio (Rio de Janeiro) entre os dias 8 a 16 de maio de 1985.

Com produção do Sindicato dos Músicos, (músicos, artistas, produtores e outros, participaram de graça), a reunião de todos chama atenção dos políticos da época, que tanto naquele tempo quanto atualmente parecem distantes do que continua a acontecer na região Nordeste.

Disco lançado em 1985, com duas faixas "Seca 'Água" e "Chega de Mágoa", segundo consta, teve decidida participação de todos, e Chico Buarque um dos maiores entusiastas com companheiros a ter esta atitude.
Não existem informações exatas sobre que resultou o projeto, sabemos que os dois clips destas músicas passaram no programa da TV Globo 1985, onde Chico e Caetano tinham programa exclusivo.
No projeto, o resultado das vendas do disco como objeto secundário a ser repassado em termos da importância do projeto, e transferidos aos Estados e remanejadas aos atingidos p/ cataclisma natural que a séculos aflinge o povo nordestino, não se sabe resultado, mas a verdadeira importância foi atingida. Chamar atenção para a secular falta de atenção

O mais palpável é a reunião da força positiva de artistas brasileiros. Possivelmente será dificil ver de novo todos desta oportunidade única, juntos em constelação interestelar no mesmo momento, empenhados em juntar forças na música brasileira para objetivo comum.

São vídeos raros de uma reunião, guardem pra sempre esta energia.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Trailer do Filme Luzia Homem

Trailer do Filme "Luzia Homem", realizado sobre o livro Luzia Homem de Domingos Olimpio, totalmente filmado no Ceará em 1987.
Ednardo realizou a trilha musical original do filme além de atuar como ator no fio condutor do personagem "Poeta de Cordel".

Na década de 80 é o primeiro filme brasileiro que toca de forma contundente, ao mesmo tempo realista e romântico, sobre a questão da reforma agrária, e também é o primeiro filme brasileiro a utilizar em sua trilha de sonorização o sistema dolby estéreo, que fornece significativa melhora de som no que antes eram chiados e trilhas quase inaudíveis.

sábado, 29 de setembro de 2007

Ednardo cantando - Saudação da Alegria


Ednardo cantando Saudação da Alegria de Calé Alencar. Música lançada no Balanço da Massa, durante três dias no Fortal (carnaval fora de época em Fortaleza), que balançou a massa em Julho 1995. No show - Do Pageú ao Papicú, realizado no Parque do Papicú em 13 de abril de 1997.

Saudação da Alegria
Calé Alencar

É no Balanço da Massa que eu vou
Saudação da alegria, meu amor
Brisa beija e balança
Abençoa a dança, só vai dar você

É no Balanço da Massa, que eu 'tou
Saudação da alegria, minha flor
Teu sorriso é tão lindo
É o sol se abrindo
Só vai dar você

Uô ô ô, vai, vai, vai
Meu amor, vai, vai, vai
Só vai dar você
Vai, vai, vai
Minha flor, vai, vai, vai
Só vai dar você

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Patativa do Assaré

Patativa do Assaré em entrevista realizada por Jackson Oliveira Bantim (Bola), enviada ao Zeca Zines através de Ednardo, trecho do documentário realizado por Bola enviado em 15/08/2003.

Nesta entrevista Patativa do Assaré, responde entrevista de Bola e recita duas poesias - Caboclo Roceiro e Menino de Rua.

Patativa do Assaré - Antonio Gonçalves da Silva - é um gênio e antena da raça, como fala Ezra Pound, estudado como fenômeno de comunicação popular com suas poesias e repentes, pela Universidade de Sorbonne na França, por Raymond Cantel, na cadeira da Literatura Popular Universal, e por Sylvie Debs em Literatura Comparada pela Universidade de Toulouse – França e outras Universidades de Praga e Moscou, Universidade de Poitiers – França, Alemanha, Japão, Estados Unidos, Inglaterra; e etc.
No Brasil, todas maiores universidades, USP; UFC; UFMG;UnB; UFPE; PUC/SP e muitas e muitas outras dedicam através de seus mestres e alunos, extensos estudos à Patativa do Assaré. Como símbolo emblemático deste bardo nordestino que possui em sua simplicidade o poder de comunicar-se com todas gamas de entendimento.

Sua arte somente ficou mais conhecida em Fortaleza, Nordeste e Brasil e Exterior, a partir de 1979 quando participou da Massafeira Livre, à convite de Ednardo, quando foi gravado seu primeiro disco. Até então Patativa era ilustre desconhecido em sua própria terra o Ceará, e o mundo não sabia de sua existência.
A partir da Massafeira, Patativa passou a ser reconhecido por todos, e seus versos amplificados em livros, estudos e teses e também musicados e cantados por muitos artistas.
Vale lembrar que antes, Luiz Gonzaga , musicou um de seus versos – Triste Partida - E depois da Massafeira, outros artistas foram musicando e cantando sua obra, e obteve atenção dos estudiosos sobre sua obra.

Zeca Zines

_______________________________________


Patativa do Assaré - nasceu aos 5 de março de 1909, em Assaré (CE) e aí morreu aos 8 de julho de 2002. Iniciou o seu contato com a poesia a partir das cantorias, (destas herdou a diversidade temática, o jogo mote & glosa, as pelejas, o gosto pela redondilha, na métrica; e por sextilhas, quadras ou décimas, na estrofe); depois, realizou folhetos; por fim, o cordel e os poemas avulsos.

O discurso poético de Patativa insere-se na tradição oral, ainda que não se apresente como um repentista, mas, sim, como um poeta, cujos versos nos chegam a partir da palavra impressa. Essencialmente telúrico, sua poesia brota da terra agreste, e esta lhe fornece elementos recorrentes, extraídos tanto do homem quanto da paisagem.
A pouca escolaridade, (ele freqüentou apenas seis meses de escola, onde aprendeu a ler e a escrever) não lhe impediu de ser um leitor voraz, uma vez que, a rigor, tornou-se um autodidata.
Para a construção de seu arcabouço poético, leu não apenas o ´Tratado de Versificação´, de Olavo Bilac, bem como a poesia romântica brasileira, em especial Castro Alves (fundamental para a sua consciência da poesia como discurso engajado) e Gonçalves Dias (este, um poeta que palmilha o épico e o telúrico).
Ainda que haja desenvolvido diversos metros e muitas modalidades poéticas, nesse livro ´Cordéis e Outros Poemas´, serve-se, em relação à disposição das estrofes, das sextilhas (agrupamento de seis versos) e das décimas (agrupamentos de dez versos), havendo, também, o emprego das oitavas (agrupamentos de oito versos); e a métrica é, predominantemente, a redondilha maior ou heptassílabos (versos com sete sílabas poéticas) e, em menor escala, a redondilha menor ou pentassílabos (versos de cinco sílabas poéticas).

Sua poesia é oral, tendo, assim, raízes nas experiências primitivas, desembocando nas cantorias, desafios e provocações de motes.
A denominação ´Literatura de cordel´ tem sua origem em Portugal; mas, no Brasil, tem a ver com a composição de folhetos impressos - experiência genuinamente nordestina. O cordel é uma narrativa poética , cuja temática se apresenta por demais diversificada, enveredando pela épica, pela lírica, pelo dramático, pelo burlesco, pelo grotesco, pela caricatura, podendo tanto concentrar-se em motivos realistas quanto nos gêneros maravilhoso, fantástico ou estranho.

O ABC, por sua vez, é uma narrativa, (´ABC do Nordeste Flagelado´ - este em décima e em redondilha maior) em que de A a Z, cada estrofe tem início com a seqüência das letras do alfabeto.
Mote é uma estrofe anteposta ao início de um poema, utilizado pelos poetas como motivo da obra cujo conteúdo desenvolve a idéia sugerida pela estrofe; pode ser um adágio, uma sentença, sendo o ponto de partida para o desenvolvimento de uma temática; em síntese, é um conceito, expresso, em geral, num dístico para ser glosado.
Glosa é uma décima (estrofe de dez versos) às quais servem de mote os quatro versos de uma quadra ou de um dístico; -estes dísticos devem estar contidos na décima.
Assim, a glosa é uma composição poética que desenvolve um mote; classicamente, é uma décima única onde se inclui o mote de um ou de dois versos poéticos.
Sua poesia implica o encontro entre o homem e a terra, estando estes de tal modo intrincados que, em verdade, não é possível compreendê-los separadamente. Sua voz canta a natureza rústica, agreste, mas, ao mesmo tempo, bela, encantadora, entranhada na vivência e na memória do poeta. A linguagem, pois, emana dessa terra; desse modo, anuncia-se com a espontaneidade da fala matuta, com o forte acento na vogal no final dos versos.


Trecho de matéria Diário do Nordeste - Fortaleza - Ceará - 30/09/2007
Carlos Augusto Viana

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Ednardo cantando A Manga Rosa

Ednardo cantando A Manga Rosa
O disco com essa música, passou 8 meses emperrado pela censura federal que proibiu lançamento do disco todo.
Em temporada de quatro dias, Teatro Estação Beira Mar - Espaço Cultural do Museu do Telephone, uma senhora foi todos os dias e sentava-se na primeira fila cantando as músicas com entusiasmo, no terceiro dia ela foi ao camarim e se identificou – “Meu filho, sou a Lourdes da censura federal, fui eu que proibi seu disco, e agora estou vendo a beleza de música e poesia, vim aqui para que você perdoasse e entendesse que eu era funcionária pública e recebia ordens”....
No dia seguinte, Ednardo, após saber que ela estava de novo na platéia, deu o troco com categoria estonteante e dedicou a música à antes censora e agora fã.... veja o restante da história...

A Manga Rosa
(Ednardo)

A manga Rosa
Maria, Rosa
Rosa, Maria, Joana
Peitos gostosos, rosados doces
Rosados doces, mama, mama, mamãe
Teu sumo escorre da minha boca
Entreaberta porta por onde entra, por onde sai
Por onde entra e sai o mundo
Mundo
Balança a fronde farta mangueira
E mata a fome, morto a fome
Ou mata, imensa mata
Imensa massa, florados cachos
De verde, amarelou, maduro fruto
Que pro nosso gozo vem
Amem, amem, amem, amem
Mamem, mamem, mamem
Amém, amém, amém, amém

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Ednardo cantando Única Pessoa

Ednardo cantando Única Pessoa (Ednardo e Chico César), show do Pageú ao Papicu, Fortaleza 13 de abril de 1997.

Única Pessoa
(Ednardo e Chico César)

Parece que me conheço
Tempo tamanho viver
Toda pessoa em tí, brilho, beleza e fala
Amigo antigo de ter
Par esse no mesmo manto
Sempre aquí, ontem e depois
Olhos de alcance infindo
No preto e branco há cor
Música, silêncio, palavras

Iê planta, asfalto, iê flor
Plural, única pessoa
Tudo de sí e de sou

Parece que tudo passa
Por tudo que é praça e gente
Pelo fio da esperança
Pelo pé na corda bamba
Igual e tão diferente
Parece que tudo fica
Tudo muda, musa tudo
E eu que bem me ví menino
Na panela iridecente
Mão de música, luz e loa

Iê planta, asfalto, iê flor
Plural, única pessoa
Tudo de sí e de sou

Ednardo cantando Mucuripe

Ednardo cantando Mucuripe (Fagner e Belchior) show Do Pageú ao Papicu, Fortaleza 13 de abril de 1997.

Mucuripe
(Fagner e Belchior)

As velas do Mucuripe vão sair para pescar
Vou levar as minhas mágoas pras águas fundas do mar
Hoje a noite namorar, sem ter medo da saudade
Sem vontade de casar
Calça nova de riscado, paletó de linho branco
Que até o mês passado, lá no campo ainda era flor
Sob o meu chapéu quebrado
Um sorriso ingênuo e franco
De rapaz novo e encantado de vinte anos de amor

Aquela estrela é dela
Vida, vento, vela leva-me daqui

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Música das nuvens e do chão



Pra completar esta trilogia de músicos: Hermeto Paschoal, Theo de Barros, Heraldo do Monte, que achamos geniais, Zeca Zines, reproduz recente artigo da jornalista Eleuda de Carvalho - Jornal O Povo - Coluna Periférica 11 / 09 / 2007 http://www.opovo.com.br/colunas/periferica/727717.html




Por ser albino, o pequeno Hermeto ficava enfiado em casa, espiando as réstias de luz pelo buraco da telha e escutando os sons que vinham de fora, era barulho de cabra, era pio de passarinho, eram as rodas do carro de boi, cantando na estrada.
Os pais e os outros manos de sol a sol colhendo a vida, do que a terra dava - lá em Lagoa da Canoa, município de Arapiraca.
A terra do fumo, nas Alagoas. Foi ali que o bruxo sem cor nasceu.
Cresceu, e foi embora, tocando um instrumento. Primeiro, a sanfona, tão querida dos sertanejos. E as flautas-pífanos. Violão. Harmônio. Piano. Queria mais. Hermeto Paschoal faz música com tudo.
Panela, chocalho, patinho de borracha, apitos de feira, atiradeira, o diabo a mil. Um dos seus melhores discos: Cérebro Magnético. O LP (não sei se já tem em CD) inclui composições como Música das Nuvens e do Chão, linda demais, suave, mágica. E tem uma, bem curtinha, Correu Tanto Que Sumiu. E a música é isso mesmo, uma coisinha apressada, aperreada que, de repente, chega ao fim. Legal demais!
Assim como Ilza na Feijoada e Spock na Escada, as duas de outro disco, esqueci o nome agora. Ilza foi a primeira esposa de Hermeto, uma mulata fornida, que deveria preparar feijoadas deliciosas. E Spock, um dos cachorros do artista. Entre volutas de pianola e uns sopros de flautim, o cachorro latindo na escada...
Certa vez, num festival de música no Crato, começo dos anos 90. No palco, Hermeto Paschoal em muito boa companhia. Além dos feras que trabalham com ele, o mago botou pra tocar junto, ali, na hora e sem frescura de ensaio, uma dupla de emboladores, visivelmente truviscados, e os incríveis Irmãos Aniceto, batendo caixa, os pifes sonorosos, a mão de agricultor percutindo firme e forte a pele tesa do zabumba, eles trocando os pés, no seu balé inimitável.
E Hermeto soprando uma chaleira velha cheia dágua, passeando pelo palco, seguido dos Anicetos e dos emboladores, aspergindo os que estavam na borda do palco com a água e o cuspe misturados no bico da chaleira. Eita, mundo bom! Eita, danado!

Eleuda de Carvalho

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Pra refletir

BOI DE HAXIXE
Zeca Baleiro


Quando piso em flores
Flores de todas as cores
Vermelho sangue, verde oliva, azul colonial
Me dá vontade de voar sobre o planeta
Sem ter medo da careta
Na cara do temporal

Desembainho a minha espada cintilante
Cravejada de brilhantes, peixe espada vou pro mar
O amor me veste
Com o terno da beleza
E o saloom da natureza
Abre as portas pra eu dançar

Diz o que tu quer
Eu dou
Se tu quer que eu vá
Eu vou

Meu bem, meu bem me quer
Te dou meu pé, meu não
Um céu cheio de estrelas
Feitas com caneta bic
Num papel de pão

Zeca Zines indica pra refletir, sobre as jóias embaladas em papel de pão, ouvir duas gravações desta música - com Zeca Baleiro no disco "Vô Imbolá" faixa 10, e outra interpretação com a excelente Ceumar - no disco Dindinha, faixa 07.

Jóias raras em embalagens de papelão






Há problemas que são universais e, definitivamente não são exclusivos do Brasil. Mas aqui a coisa é pior que no chamado “mundo civilizado”.As grandes gravadoras não possuem interesse de relançar em CD grandes obras por questões de mercado (leia-se, grande volume de vendas que mantenham uma saudável margem de lucros e ainda compensem a maldita pirataria). De vez em quando aparece algo surpreendente. A excelente e heróica gravadora TRAMA lançou pelo selo ELDORADO duas preciosidades que ainda não haviam sido convertidas (oficialmente) do vinil para o CD. Trata-se o disco “PRIMEIRO DISCO” do lendário cantor, diretor, arranjador e músico THEO DE BARROS)”.

Este carioca filho do compositor alagoano Teófilo de Barros Filho compôs sua primeira canção ainda na adolescência e com 19 anos já tinha duas músicas interpretadas por Alaíde Costa, "Natureza" e "Igrejinha". Somente em 1980, 15 anos após enorme sucesso das músicas "Menino das Laranjas" e “Disparada” (esta última em parceria com Geraldo Vandré) nas vozes de Elis Regina e do sambista Jair Rodrigues, respectivamente, é que Theo gravou seu primeiro LP, o álbum duplo PRIMEIRO DISCO.
O disco, consistente e extremamente bem arranjado, traz pérolas com a interpretação particular de Theo para “Disparada” e “Menino das Laranjas” além de incursões instrumentais beirando a perfeição como “Estória” que o compositor assina em parceria com Paulo César Pinheiro. Theo mostra, com grande mestria, seu lado romântico em “Ando te Amando Tanto” também em parceria com Paulo César.
O segundo disco ora lançado pela TRAMA-ELDORADO foi igualmente editado pela primeira vez em CD cuja data do lançamento em vinil coincide com o disco do Theo, 1980; trata-se do trabalho do músico Pernambucano HERALDO DO MONTE, cujo título leva seu nome e coincidentemente é o seu primeiro disco solo.

Heraldo iniciou sua carreira profissional em Recife, acompanhando cantores em boates. Ainda nos anos 60, teve trabalhos seus gravados por artistas como Walter Wanderley e Dolores Duran. Fez parte, ao lado de Airto Moreira e Theo, do Trio Novo, ao qual Hermeto Pascoal viria a se juntar, formando o Quarteto Novo, com o qual gravou, em 1967, o LP "Quarteto Novo", lançado pela Odeon. Virtuose da viola caipira, cavaquinho, violão e guitarra, foi um dos responsáveis pela introdução da
Improvisação (típica do jazz americano) na Música Popular Brasileira. Esta levada é bastante latente na faixa que abre o disco “Forrozin”. O disco conta com a participação, entre outros, de Dominguinhos e Hermeto Paschoal este último com vocais, órgão e flauta. Heraldo ainda paga um tributo ao mestre Pixinguinha com a belíssima faixa “Lamentos” que o chorão fez em parceria com Vinicius de Moraes. Os elementos nordestinos estão pressente no frevo “Chuva Morna” e na magistral releitura de “Pau de Arara” de autoria de Luiz Gonzaga e Guio de Moraes.
Os dois lançamentos da TRAMA-ELDORADO são jóias da nossa MPB. Contudo, como disse no início deste texto, as coisas no Brasil, em relação a nossa memória. Enquanto os lançamentos de grandes nomes da musica internacional são lançados no exterior (em especial na Europa e Ásia) com requintes e consideração, os discos de Theo e Heraldo são de uma pauperrísse assustadora. Começa pele encarte. O disco do Theo sequer tem referências aos músicos e demais profissionais que participam do trabalho; esta referência existe no disco do Heraldo porque na capa traseira do LP haviam estas referências e como o material foi copiado na íntegra pelo menos se sabe quais foram os músicos que participaram do disco. Salvam-se os textos dos jornalistas e pesquisadores Eduardo Magossi e Wilson Meneses da Hora. Mas o pior não está nos encartes.
Não tenho notícia de uma qualidade de áudio tão ruim quanto a que está presente nestes trabalhos.
Não sei o que houve, mas a impressão que dá é que se está ouvindo um disco de vinil arranhado em uma daquelas antigas vitrolinhas a pilha com o autofalante furado. Mérito à parte pela recuperação destes dois discos maravilhosos, os mesmos não mereciam um acabamento (áudio e gráfico) tão aquém da grandiosidade e importância destas duas obras. São verdadeiras jóias envolvidas não em estojos dignas do seu valor, mas em verdadeiras caixas de papelão de terceira qualidade.

Post enviado por Antonio Inácio dos Santos Júnior.

sábado, 25 de agosto de 2007

Ednardo cantando Longarinas - Clipe

Ednardo cantando Longarinas na Ponte Velha da Praia de Iracema - Fortaleza / Ceará, 1991.
A locação do clipe foi realizada antes da ponte passar pela reforma que a modernizou.
Este clipe faz parte do DVD - Ednardo Ceará Quatro Estações

Longarinas
Ednardo

Faz muito tempo que eu não vejo o verde daquele mar quebrar
Nas longarinas da ponte velha que ainda não caiu
Faz muito tempo que eu não vejo o branco da espuma espirrar
Naquelas pedras com a sua eterna briga com o mar
Uma a uma as coisas vão sumindo
Uma a uma se desmilinguindo
Só eu e a ponte velha teimam resistindo
A nova jangada de vela
Pintada de verde e encarnado
Só o meu mote não muda
A moda não muda nada
E o mar engolindo lindo
A antiga praia de Iracema, o mar
Os olhos grande da menina
Lendo o meu mais novo poema
A lua viu desconfiada
A noiva do sol com mais um supermercado
Era uma vez meu castelo entre mangueiras e jasmins florados
Beira-Mar iê ê Beira-Mar
Iê maninha, arma aquela rêde branca
Arma aquela rêde branca
Que eu vou chegando agora

Ednardo cantando Dorothy L'amour e Lupiscínica - Clipe

Ednardo cantando as belíssimas músicas Dorothy L'amour de Petrucio Maia e Fausto Nilo e Lupiscínica de Petrúcio Maia e Augusto Pontes, 1991.
O visual destes clips captam uma ainda bela Praia de Iracema em Fortaleza-Ceará. Antes da reforma do local e o aprazível local do Getty's não existe mais - como ele canta em Longarinas... "uma a uma as coisas vão sumindo, uma a uma se desmilinguindo... só eu e a ponte velha teimam resistindo"...

Dorothy L'amour
Petrúcio Maia e Fausto Nilo

Dorothy L'amour com amor te matei
Sereia, na areia do cinema
Dorothy L'amour com ardor te adorei
No drama da primeira fila
Adorei, no drama, o teu sabor azul
Estranho como a primeira, a primeira coca-cola

Era miragem, fantasias de um mundo blues
E eu fui chorar na areia Dorothy L'amour
Por que sangrar meu nativo coração do sul
Ái, eu fui naufragar em teus olhos de mar azul
A tua cor, o teu nome, mentira azul
Tudo passou, teu veneno, teu sorriso blues
Ái, hoje eu sou água-viva dos mares do sul
Não quero mais chorar, te rever Dorothy L'amour

Lupiscínica
Petrúcio Maia e Augusto Pontes

Vamos adiar essa briga, amor
Eu estou cansado
Deite aqui do lado e não fale mais
Eu estou calado
E não balance essa chave
Vai acordar meu remorso
A tua bolsa guarda segredos de mim
E por mais que mexa e remexa
É você que não deixa ver
Quantas vezes eu mudei de conversa, pra não falar
Quantas vezes eu dobrei de esquina, pra não ver
E hoje sinto ciúmes até da tua falta
Mas não vou mais matar
Matar ninguém por tua causa
Mate-me que já te matei
Inutilmente bêbado, triste como um peixe afogado
Na madrugada sonolento
De bolero em bolero
Acuerda-te daqui a poco
Você está com a vida que pediu à Deus
Acuerda-te daqui a poco
Você está com a vida que pediu, adeus

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Ednardo cantando Ingazeiras - Show

Ednardo cantando Ingazeiras - show no VI Navegarte em julho 2006 - Prainha Aquiraz - Ceará.

Ingazeiras
Ednardo

Nasci pela Ingazeiras
Criado no ôco do mundo
Meus sonhos descendo ladeiras
Varando cancelas
Abrindo porteiras
Sem ter o espanto da morte
Nem do ronco do trovão
O sul, a sorte, a estrada, me seduz
É ouro, é pó, é ouro em pó que reluz
É ouro em pó, é ouro, é pó que reluz
O sul, a sorte, a estrada, me seduz

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Ednardo cantando Imã - Clipe Musical

Ednardo cantando Imã em Jericoacoara e Serra da Ibiapaba - Ceará. Este clipe faz parte do DVD - Ednardo Ceará Quatro Estações

Imã
Ednardo

Rasgando um buraco no azul
Tu afloras feito o arco-iris
Com o pé pisando no tempo, e o outro no espaço
Molha a sequidão do meu rosto de pedra
Na água cristalina
Em nosso rastro ferido arde o Brasil e a nossa sina
Nada te dou como herança, nada quero
A vida é uma pessoa sem medo no caminho
Tudo te dou como herança, tudo quero
A vida é uma pessoa sem medo no caminho

Estrela de cinco pontas
Luminando noites
No universo do chão ardendo
Luminando noites
Habitamos o verbo chamado homem
Luminando noites
Cumprindo o destino do ser
A raiz aflora na terra
E bebe os segredos da areia
Espalhando em cada folha
Uma canção ao vento leve

Leve é aquilo que brota muito além do medo
Serena é a coragem de tudo aquilo que é
Que é quem sempre caminha e nunca pensa que tarda
E sua flecha certeira sempre crava na luz
Crava na luz e sempre amanhece

domingo, 19 de agosto de 2007

Ednardo cantando A Palo Seco

Ednardo cantando A Palo Seco, (música de Belchior), no VI Festival Navegarte 2006, Prainha - Aquiraz/Ceará (22 Julho 2006), para um público de mais de 15 mil pessoas.

A Palo Seco
(Belchior)

Se você vier me perguntar por onde andei
No tempo em que você sonhava
De olhos abertos lhe direi
Amigo, eu me desesperava
Sei que assim falando, pensa
Que esse desespero foi moda em 73
Mas ando mesmo descontente
Desesperadamente eu grito em português
Tenho vinte e cinco anos
De sonho e de sangue e de América do Sul
Por força deste destino um tango argentino
Me vai bem melhor que um blues
Sei que assim falando pensas
Que esse desespero foi moda em 73
Mas quero é que esse canto torto
Feito faca corte a carne de vocês

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Ednardo - Trecho de Entrevista-Musical

Trecho de Entrevista - Musical de Ednardo concedida ao programa "Nomes do Nordeste" - no CCBNB (Centro Cultural BNB) - Fortaleza em 30 de janeiro de 2007. Neste trecho ele fala de trilha de cinema e comenta a música "Valsa Felliniana"realizada para o Filme "No calor da pele" do cineasta Pedro Jorge de Castro, e junta a mesma recita uma novíssima letra/poesia "Delta de Sal e D'Ôcê (Ednardo e Climério).

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

A Pior Música do Mundo

Polemizando com o conhecido slogan que a Música Popular Brasileira é "A Melhor Música do Mundo", o colecionador e estudioso de música brasileira e internacional, Antonio Inácio Jr., envia outra colaboração de suas observações musicais, as quais Zeca Zines democráticamente publica na íntegra.

Em uma determinada tarde no início dos anos 90 estava assistindo ao extinto “Matéria Prima”, veiculado pela TVE, cujo apresentador era Serginho Groisman. O programa era leve e bem agradável até que, um dia, foram convidados, entre outros, o maestro Júlio Medaglia, a Banda Taffo (Wander Taffo) e o João Gordo. Não me lembro se foi antes ou depois da apresentação de Taffo que se abriu uma discussão sobre a qualidade do Rock brasileiro. O maestro, figura internacionalmente reconhecida e de grandes contribuições à música (clássica e popular) brasileira e detentor de um conhecimento musical ímpar falou do alto de sua importância que o rock que se fazia do Brasil era apenas “um rockinho”. Dali em diante o que se viu foi a mais lamentável falta de respeito ao mestre (como pessoa e como profissional) e a mais profunda incapacidade de argumentação dos outros convidados.
Foi uma chuva de agressões ao Júlio Medaglia com a conivência do Sérgio Groisman em um ambiente abertamente hostil ao maestro.

O João Gordo, que jamais acrescentou algo de útil à vida musical brasileira, principalmente quando se lembra que ele traiu de forma vergonhosa o movimento punk, praticamente falou que o maestro não entendia de rock ao mesmo tempo em que se dirigia a ele jocosamente chamando-o de “tio”. Tio? Se o maestro tivesse um sobrinho velho daquele (há época com aproximadamente 30 anos) possivelmente teria uma tratamento melhor de alguém que conhecesse música. O Wander Taffo, que até então estava calado, tomou a palavra e argumentou que não concordava com o maestro. Apesar dos argumentos do maestro lembrando seu convívio com Frank Zappa, entre outros grandes nomes do rock, ele não foi ouvido pela turba ignara ali presente.

A cada investida do João Gordo, mais inflamada ficava a platéia, formada basicamente de jovens com idade não muito superior a 20 anos, e mais hostil ao maestro era o clima. Passivamente, e ao meu ver sem responsabilidade, Sérgio Groisman comandava o programa sem solicitar aos presentes que, ao menos, respeitassem o Maestro. A única coisa que Sérgio fez de bom foi ler um fax que haviam enviado para o estúdio da TVE pedindo que se respeitasse o Júlio Medaglia.

O Júlio tinha razão. Já estávamos nos pobres anos 90 começo da derrocada da MPB e, principalmente, do Rock brasileiro.

Não há rock em lugar nenhum do mundo que não possua influência da música Britânica ou mesmo Norte-Americana. O rock brasileiro (bandas ou artistas solos) não é exceção e isto é normal. Contudo, cada artista dá seu “toque especial” como fizeram Rita Lee e Raul Seixas nos anos 70.

Das bandas nacionais dos anos 70, que sofreram influência profunda do rock progressivo inglês, talvez somente O Terço, durante a passagem do Flávio Venturini, é tenha incluído nas suas músicas elementos do cancioneiro popular brasileiro, como no disco “Criaturas da Noite” (vide “Queimada”, “Criaturas da Noite” e “Jogo das Pedras”); também no último e derradeiro disco com a participação do músico mineiro, “Casa Encantada”, há elementos da MPB como nas músicas “Foi quando eu vi aquela lua passar” e “Pássaros”. Nos demais casos as letras do rock brasileiro dos anos 70 foram fracas e, na maioria das vezes, muito “bixo-grilo”. A exceção foi A Barca do Sol cujas letras, em grande parte, eram do ótimo poeta Geraldo Carneiro e o Moto Perpétuo cuja maioria das letras em seu primeiro e único disco foram, quase todas, escritas por Guilherme Arantes em sua fase mais criativa.

Da mesma forma que o rock brasileiro dos anos 70 sofreu influência do Pink Floyd, Emerson, Lake & Palmer Yes, Gênesis, Gentle Giant, etc. o rock dos anos 80 sofreu grande influência de bandas como The Police, U2, The Smiths, The Clash, etc. Ambas as gerações sofreram influência dos Beatles e Rolling Stones.

A diferença é que o rock dos anos 80 foi mais fecundo em termos poéticos se comparado à geração anterior. As letras poderiam ir do romantismo escrachado do Cazuza ao teor denso da poesia do Renato Russo, e tudo isto com mais cara de Brasil do que na década anterior. Por isto eu acho o Rock brasileiro dos anos 80 melhor do que o que se fez no Brasil na década de 70.

Ocorre que, como no resto do mundo a partir no início dos anos 90, a música brasileira, em especial o rock nacional, entrou de vez na linha de produção pasteurizada das grandes gravadoras e nem de longe lembra o que se fez nos anos 70 ou 80. É uma hecatombe de mediocridade tão poderosa que as exceções são cada vez mais raras e desconhecidas do grande público. Portanto, claro que maestro Júlio Medaglia estava coberto de razão. O mais grave é que não se limitou à retórica de um tema isolado. O desrespeito ao maestro foi só a ponta do iceberg do entulho cultural que nos soterraria. Estamos vivendo a pior fase da musica brasileira de todos os tempos em que os espaços se fecham para os trabalhos espontâneos e verdadeiros que são relegados ao ostracismo quase que absoluto tirando do verdadeiro artista a sua condição de viver, sobreviver e criar. É democrático que haja na mídia, que nunca foi amiga de ninguém exceto do próprio bolso, espaço para toda e qualquer forma de manifestação. As pessoas tem o direito de escolher ouvir Tom Jobim ou Ivete Sangalo, desde que ele tenha acesso aos dois e decida o que quer ouvir. Na estrutura atual só esta cantora possui espaço.

Certa vez vi Júlio Medaglia afirmar que do jeito que a coisa está, estamos caminhando para a criação da pior música do mundo. Para o maestro, ouvir boa música em nosso país é um privilégio, atualmente, para poucos, em razão das condições socioeconômicas da população e das raras ocasiões nas quais esse gênero de atração é ofertada gratuitamente. E ele ainda provoca: “Música está em todo lugar. Entretanto, quanto mais música se faz pior fica, por isso não tenho rádio nos meus dois carros”. Por outro lado, como enfatiza o maestro Medaglia, vão proliferando os incentivos a trabalhos sem qualidade pelo Brasil.

Tome-se como exemplo a nefasta 14ª edição do Prêmio Multishow de Música Brasileira que profanou o Teatro Municipal do Rio de Janeiro no dia 03 de julho de 2007.

Segundo os organizadores do evento, que por não temerem a Deus blasfemaram chamando o evento de “festa da música brasileira”, o Prêmio Multishow é a única premiação do país totalmente escolhida por voto popular, dos indicados aos vencedores. O público escolheu os “melhores” em dez categorias. Foram mais de 2 milhões de votos, afirmam.

Os eleitos foram:

Melhor Clipe: "Dor de verdade" - Marcelo D2
Melhor Show: Ivete Sangalo
Melhor DVD: CPM 22 - Ao vivo
Melhor CD: Multishow ao vivo - Ivete Sangalo no Maracanã
Prêmio Revelação: NX Zero
Melhor grupo: Capital Inicial
Melhor música: "Senhor do tempo" - Charlie Brown Jr.
Melhor instrumentista: Champignon (Revolucionários)
Melhor cantor: Rogério Flausino (Jota Quest)
Melhor cantora: Ana Carolina

A lista por si só é de arrepiar, mas a bizarrice continuou com Gilberto Gil assassinando o seu belo samba estilizado “Pela Internet” em uma horrorosa versão techno. A baiana Ivete Sangalo teve, ao lado do grupo Jota Quest, o maior número de indicações de 2007, quatro ao todo.

Deste quadro de horrores talvez a Ana Carolina, que particularmente não gosto do trabalho, seja a única representante de algo que um dia se chamou de Música Popular Brasileira, ou simplesmente MPB. Quando se diz que uma banda chinfrim chamada Charlie Brown Jr. fez a melhor música, uma tal de Rogério Flausino é o melhor cantor e Ivete Sangalo é musa acho que chegou a hora de mudarmos de sigla de MPB para MPV (Música Porcaria que Vende).

Pelo amor de Deus, será que o povo decididamente não ouve Zeca Baleiro, Fred Martins, Lampirônicos, Mestre Ambrósio, Wilson Simoninha, Ed Motta, Mandrágora, Dillo D’araújo, Cascabulho ou Marcus Rocha? Este último, jovem músico carioca, gravou um dos mais belos discos dos últimos 20 anos o “Juno” em que mistura música renascentista com rock progressivo com belas referências ao cancioneiro popular.

Duro parecer saudosista, mas não dá para deixar de fazer comparações com o que já se fez em termos de música neste país como que se faz hoje. Vejamos, por exemplo, os festivais musicais que existiram nos anos 60 e 70 e compare com os atuais eventos musicais públicos. Como disse, a mídia nunca foi amiga de ninguém, mas durante as citadas décadas as rádios, TVs e gravadoras tinham que se curvar diante da boa MPB. Todos ouviam Chico Buarque, Ednardo, Milton Nascimento, Gilberto Gil, Taiguara, Sá & Guarabyra, Azimuth, Banda Black Rio, Novos Baianos, etc. E, no entanto, sempre existiram Benito di Paula, Fernando Mendes, Waldick Soriano, Reginaldo Rossi e outros tipos de artistas de menor importância cultural, mas de grande penetração nas classes mais populares. Pois é, em plena ditadura militar havia democracia musical, diferente de hoje em dia.

Voltemos às manifestações musicais coletivas a partir de um levantamento inserido no Dicionário Cravo Albin de Música Popular Brasileira.

Criado por Augusto Marzagão, o Festival Internacional da Canção (FIC) foi realizado em sete edições, de 1966 a 1972, no Maracanãzinho (RJ). O 1° FIC foi transmitido pela TV Rio e os demais pela TV Globo. O evento era dividido em duas fases, nacional e internacional. A canção classificada em 1º lugar na fase nacional representava o Brasil na fase internacional do festival, disputando com representantes de outros países o Prêmio Galo de Ouro (desenhado por Ziraldo e confeccionado pela joalheria H. Stern). Apenas duas canções brasileiras foram contempladas com o Galo de Ouro: "Sabiá" (Tom Jobim e Chico Buarque), interpretada por Cynara e Cybele, vencedora em 1968 do 3° FIC, e "Cantiga por Luciana" (Edmundo Souto e Paulinho Tapajós), interpretada por Evinha, vencedora em 1969 do 4° FIC. Erlon Chaves compôs o "Hino do FIC", tema de abertura do festival.

Veja, a seguir, o nível dos vencedores do FIC enquanto ele existiu:

1966 - I Festival Internacional da Canção
1º lugar: "Saveiros" (Dori Caymmi e Nélson Motta), com Nana Caymmi
2º lugar na fase internacional; 2º lugar: "O cavaleiro" (Tuca e Geraldo Vandré), com Tuca;
3º lugar: "Dia das rosas" (Luiz Bonfá e Maria HelenaToledo), com Maysa.

1967 - II Festival Internacional da Canção

1º lugar: "Margarida" (Gutemberg Guarabyra), com Gutemberg Guarabyra e o Grupo Manifesto
2º lugar: "Travessia" (Milton Nascimento e Fernando Brant), com Milton Nascimento, contemplado com o Prêmio de Melhor Intérprete;
3º lugar: "Carolina" (Chico Buarque), com Cynara e Cybele;
4º lugar: "Fuga e antifuga" (Edino Krieger e Vinicius de Moraes), com o Grupo 004 e As Meninas;
5º lugar: "São os do Norte que vêm" (Capiba e Ariano Suassuna), com Claudionor Germano.

1968 - III Festival Internacional da Canção

1º lugar: "Sabiá" (Tom Jobim e Chico Buarque), com Cynara e Cybele - 1º lugar na fase internacional;
2º lugar: "Pra não dizer que não falei de flores ou Caminhando" (Geraldo Vandré), com Geraldo Vandré;
3º lugar: "Andança" (Edmundo Souto, Danilo Caymmi e Paulinho Tapajós), com Beth Carvalho e os The Golden Boys;
4º lugar: "Passaralha" (Edino Krieger), com Grupo 004;
5º lugar: "Dia de vitória" (Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle), com Marcos Valle.

1969 - IV Festival Internacional da Canção

1º lugar: "Cantiga por Luciana" (Edmundo Souto e Paulinho Tapajós), com Evinha - 1º lugar na fase internacional;
2º lugar: "Juliana" (Antonio Adolfo e Tibério Gaspar), com A Brasuca;
3º lugar: "Visão geral" (César Costa Filho, Ruy Maurity e Ronaldo Monteiro de Souza), com César Costa Filho e Grupo 004;
4º lugar: "Razão de paz pra não cantar" (Eduardo Laje e Alésio Barros), com Cláudia
5º lugar: "Minha Marisa" (Fred Falcão e Paulinho Tapajós).

1970 - V Festival Internacional da Canção

1º lugar: "BR-3" (Antonio Adolfo e Tibério Gaspar), com Tony Tornado e Trio Ternura -3º lugar na fase internacional;
2º lugar: "O amor é o meu país" (Ivan Lins e Ronaldo Monteiro de Souza), com Ivan Lins;
3º lugar: "Encouraçado" (Sueli Costa e Tite de Lemos), com Fábio;
4º lugar: "Um abraço terno em você, viu mãe" (Luiz Gonzaga Júnior), com Luiz Gonzaga Júnior;
5º lugar: "Abolição 1860-1960" (Dom Salvador e Arnoldo Medeiros), com Luís Antônio, Mariá e o Conjunto Dom Salvador.

1971 - VI Festival Internacional da Canção

1º lugar: "Kyrie" (Paulinho Soares e Marcelo Silva), com Trio Ternura, 3º lugar na fase internacional;
2º lugar: "Karany Karanuê" (José de Assis e Diana Camargo), com Trio Ternura;
3º lugar: "Desacato" (Antonio Carlos e Jocafi), com Antonio Carlos e Jocafi;
4º lugar: "Canção pra senhora" (Sérgio Bittencourt), com O Grupo;
5º lugar: "João Amém" (W. Oliveira e Sérgio Mateus), com Sérgio Mateus.

1972 - VII Festival Internacional da Canção

1º lugar: "Fio Maravilha" (Jorge Ben), com Maria Alcina;
2º lugar: "Diálogo" (Baden Powell e Paulo César Pinheiro), com Tobias e Cláudia Regina.

Não menos importantes foram os festivais de música da TV Excelsior e TV Record de São Paulo e Abertura da TV Globo do Rio de Janeiro, confira a seguir:

FESTIVAL DA TV EXCELSIOR DE SÃO PAULO

1° Festival de Música Popular Brasileira (Guarujá/SP - Abril 1965)

1º Lugar: Arrastão (Edu Lobo e Vinicius de Moraes) - Intérprete: Elis Regina
2º Lugar: Valsa do Amor Que Não Vem (Baden Powell e Vinicius de Moraes) - Intérprete: Elizete Cardoso

Festival Nacional de Música Popular (junho 1966)

1º Lugar: Porta-Estandarte (Geraldo Vandré e Fernando Lona) - Intérpretes: Tuca e Airto Moreira
2º Lugar: Inaê (Vera Brasil e Maricene Costa) - Intérprete: Nilson

FESTIVAIS DA TV RECORD DE SÃO PAULO

2° Festival de Música Popular Brasileira (Teatro Record - setembro e outubro/1966) prêmio viola de ouro

1º Lugar: A Banda (Chico Buarque) - Intérpretes: Chico Buarque e Nara Leão
Disparada (Geraldo Vandré e Teo de Barros) - Intérpretes: Jair Rodrigues, Trio Maraiá e Trio Novo
2º Lugar: De Amor ou Paz (Luís Carlos Paraná e Adauto Santos) - Intérprete: Elza Soares

3° Festival de Música Popular Brasileira "O Festival da Virada" (Teatro Paramount - outubro/1967) Prêmio Sabiá de Ouro

1º Lugar: Ponteio (Edu Lobo e Capinam) - Intérpretes: Edu Lobo, Marília Medalha e Quarteto Novo
2º Lugar: Domingo no Parque (Gilberto Gil) - Intérpretes: Gilberto Gil e Os Mutantes
3º Lugar: Roda Viva (Chico Buarque) - Intérpretes: Chico Buarque e MPB-4
4º Lugar: Alegria, Alegria (Caetano Veloso) - Intérpretes: Caetano Veloso e Beat Boys

4° Festival de Música Popular Brasileira (Teatro Record - novembro e dezembro/1968) com Júri Especial e Júri Popular

1º Lugar (Júri Especial) e 5º lugar (Júri Popular): São, São Paulo Meu Amor (Tom Zé) - Intérprete: Tom Zé
1º Lugar (Júri Popular): Benvinda (Chico Buarque) - Intérprete: Chico Buarque
2º Lugar (Júri Especial) e 2º Lugar (Júri Popular): Memórias de Marta Saré (Edu Lobo e Gianfrancesco Guarnieri) - Intérpretes: Edu Lobo e Marília Medalha
3º Lugar (Júri Especial): Divino Maravilhoso (Caetano Veloso e Gilberto Gil) - Intérprete: Gal Costa
4º Lugar (Júri Especial): Dois Mil e Um (Rita Lee e Tom Zé) - Intérprete: Os Mutantes

5° Festival de Música Popular Brasileira
(Teatro Record - Novembro/1969)

1º Lugar: Sinal Fechado (Paulinho da Viola) - Intérprete: Paulinho da Viola2º Lugar: Clarisse (Eneida e João Magalhães) - Intérprete: Agnaldo Rayol

FESTIVAL ABERTURA (TV GLOBO - FEVEREIRO/1975)

1º Lugar: Como Um Ladrão (Carlinhos Vergueiro) - Intérprete: Carlinhos Vergueiro

Detalhe: Prêmio Melhor Trabalho de Pesquisa: Vou Danado Prá Catende (Alceu Valença) - Intérprete: Alceu Valença contando como participante Luiz Melodia com a música “Ébano”, se sua autoria

FESTIVAL DE MPB (TV Tupi/1979)

1º Lugar: Quem me Levará Sou Eu (Manduka e Dominguinhos) - intérprete: Fagner
2º Lugar: Canalha (Walter Franco) - Intérprete: Walter Franco
3º Lugar: Bandolins (Oswaldo Montenegro) - Intérprete: Oswaldo Montenegro

Analise e compare a qualidade dos artistas e compositores ovacionados no passado, aqui relacionados, com estes que hoje predominam soberanos em todos os meios de comunicação, distribuição e constantemente homenageados.

No passado um artista peregrinava pelas gravadoras para conseguir que alguma delas aceitasse patrocinar seu trabalho (os Beatles foram descartados por várias gravadoras) até convencer com o seu trabalho. Hoje é a gravadora que cria o artista (por assim chamar) e diz o que ele tem ou não que fazer. O importante é que se possa consumir sua música rapidamente e da forma mais descartável possível. Este era um sonho antigo das grandes gravadoras que foi acentuada pelo pavor da maldita pirataria. Para mim estas pessoas que hoje estão na moda e classificadas como “artistas” não são nada mais que vendedores de extrato de tomate em que só agrega valor se produzir em escala industrial e vender em grandes quantidades.

Há alguns anos li em uma matéria da Veja, que comentava o lançamento de um disco do Paulinho da Viola, que o sambista costumava levar um grande período de tempo entre uma gravação de um disco e outro porque ele só ia a um estúdio quando tinha algo para dizer. O Paulinho é um artista da música na sua forma mais completa de conceituação. Se ele ficar 10 anos sem gravar sempre será o Paulinho da Viola, uma instituição. Se a Ivete Sangalo, Charlie Brown Jr, J, Quest, duplas sertanejas, pagodeiros e cia. deixarem passar um ano inteiro sem lançar pelo menos um disco (linha de produção) em pouquíssimo tempo será esquecido. Isto não é arte nem aqui nem em Marte.

Como desgraça pouca é bobagem, me dói ver Caetano Veloso (marcando presença no macabro desfile do 14° Prêmio Multishow), entre outros de sua geração, desesperados para continuar na mídia e mostrar para a atual juventude como são moderninhos e amigos, quase irmãos, de todo este lixo musical que está por ai. Isto me faz lembrar uma frase na música “Caso Comum de Trânsito” do Belchior que diz: “você fica perdendo o sono, pretendendo ser o dono da palavra, ser a voz do que é novo e a vida, sempre nova, acontecendo de surpresa, caindo como pedra sobre o povo”. Nem tudo que é novo é bom ou sinônimo de evolução e progresso. O que hoje existe em termos musicais é um retrocesso jamais visto no Brasil e reconhecê-lo como “movimento” ou “nova MPB” (termo que me dá arrepios, pois a MPB nunca foi antiga ou nova e não possui limites temporais) é negar a história de um dos mais valiosos tesouros que possuímos e que mais nos referencia no exterior, a nossa Música Popular Brasileira em qualquer formato com que ela se manifeste, rock, samba, chorinho, erudita, toada, xaxado, baião, soul, jazz, côco, maracatu........

Eu não sei se Caetano gosta de negar sua biografia ou se realmente não a merece por tantas ações atuais a favor do que não presta, com raras exceções. Não parece o mesmo autor de “Um Índio” que há mais de trinta anos atrás já abordava a crise ambiental sem parecer “hiponga” ou “Bixo-Grilo”. De todas as coisas boas que os anos 60 e 70 deixaram de legado na MPB, Caetano certamente tem lugar de destaque. Por isto a minha dor.

E o mal avança com o lixo imperando, artistas importantes vendendo a alma ao Diabo e outros tantos fazendo infinitamente “releituras” de seus trabalhos porque não conseguem superar a si próprios. O quadro só não é mais desolador por que existe o catálogo da Biscoito Fino e da Kuarup, entre outros resistentes, que lutam para preservar a integridade da nossa cultura, pois o abismo está bem perto e estamos caminhando, como diria nosso grande maestro Júlio Medaglia, para a pior música do mundo.

Post enviado por Antonio Inácio Júnior