domingo, 16 de maio de 2010

Aos Meus Heróis - Julinho Marassi e Gutemberg


Uma dupla interessante do interior do Rio de Janeiro - Nem tudo está perdido , mas ao mesmo tempo falam do passado realizado por outros para se incluir no presente, talvez seja esta a forma possível no momento, vamos ficar atentos às suas próximas músicas.




E a turma canta junto em Barra Mansa - RJ, parece ser também uma empresa que promove os artistas no local.





É preciso ver e escutar tudo o que está acontecendo no Brasil, não só na televisão e nas rádios "normais" que são os que menos demostram em suas programações a diversificação musical brasileira.

Se de um lado os autores desta música demonstram seus apreços de forma "saudosa" e honram seus heróis, de outra forma desconhecem fatores que levam de tempos em tempos artistas serem retirados do mass mídia em troca de "cérebros" ou "corpos" mais jovens portanto pouco experientes e portanto mais "utilizáveis" por desconhecimentos das lides e que serão por sua vez substituídos por outros em uma velocidade voraz.

Mucuripe

Música inaugural da parceria Fagner e Belchior do Pessoal do Ceará, nos inícios da década de 70, posteriomente interpretada por Elis Regina.




Indicado por Claudete Jucá

sábado, 15 de maio de 2010

Corações Guerreiros

Foto: Edilmar Soares

Gilmar de Carvalho reflete sobre a formação da cultura cearense, as características que nos fazem exímios artesãos e iconoclastas sem passado.


Gilmar de Carvalho - especial para O POVO 08 Mai 2010




É sempre oportuna a discussão sobre a cultura no Ceará. À medida que falamos, jogamos luz sobre as áreas de sombras, revolvemos o que se esconde por trás do verniz das aparências e chegamos mais próximos dos ``corações guerreiros``, como canta o Hino do Estado, com letra de Thomaz Lopes e composição de Alberto Nepomuceno.
Pode-se pensar na importância indígena (muitas etnias) na formação do tripé com a herança africana (diversas nações) e a contribuição lusa (com traços mouros e judaicos, dentre outros). No nosso caso, esta herança tem sido negada desde sempre.

Decreto de 1861 rejeitava esta presença. José de Alencar foi forte e inaugurou com Iracema uma base simbólica para nossa fundação, propondo um relato mítico que se atualiza hoje com a presença estrangeira e o mercado do sexo e afirmando nossa condição indígena.
A negação persiste por parte de quem teme que não vinguem seus projetos de siderúrgicas, refinarias e termoelétricas na terra dos Anacés, por exemplo. Esta insistência da negação revela o lado perverso de uma não aceitação do que somos, como se buscássemos uma idealização que o espelho insiste em não refletir.

A partir daí, tudo dá voltas, se mascara e complica um ponto nodal, porque o que somos depende de uma atitude que implica a aceitação de limites, a quebra de estereótipos (irreverência, hospitalidade, etc) e a (re)construção madura de um estatuto e de uma condição.
Nossa história é uma história de lutas e de adequação a um meio adverso. O areal das primeiras crônicas, a dificuldade de desembarque, as secas, tudo nos levou a saídas em que buscamos a criatividade e a sobrevivência.

Nossa tradicional habilidade vem daí. Aprendemos a conviver com o meio e trabalhamos, sem nos darmos conta, muito bem a relação da natureza com a cultura. Por isso, bordamos, somos seleiros, ceramistas, esculpimos. Vamos do utilitário ao estético (que não se contradizem) num piscar de olhos. Nossa cozinha também é um lugar de resistência. Trabalhamos bem as sobras e o que nos legou um chão árido. Nossa farinha vai da paçoca ao pirão. E assim por diante...
Somos nômades e isso já foi dito muitas vezes antes. Falam em ciganos e insistem que somos judeus brasileiros. Não faz muito sentido. Saímos daqui pelas condições adversas que se nos apresentam.

A ``síndrome do carneiro`` foi proposta por Augusto Pontes, em parceria com Ednardo. E se voltávamos em emissões das redes de televisão, voltamos mais ainda hoje, com a Internet e com novas mídias que se antecipam interativas.
A rigor, as elites do século XIX precisaram do êxodo para uma afirmação na Corte (Alencar, Araripe Jr, Nepomuceno, Beviláqua, Capistrano). Hoje, nem tanto. Os intelectuais do século XIX talvez intuíssem que somos fortes quando nos juntamos.

Sozinhos, valemos pouco diante das regras do mercado. Nossos ancestrais africanos deixaram os maracatus. Plangentes e doloridos, os cortejos foram jogados no meio do carnaval, quando não têm nada de dionisíacos.

E mesmo os cultos afros foram tratados com o caso de polícia até a primeira metade do século XX, que o diga o antropólogo Ismael Pordeus. Sobre os portugueses, trouxeram uma língua que nos une e nos dá liga.
Além disso, temos festas dos caretas, pastoris, encenações de folguedos e uma literatura da voz (cordel) que se junta com a cantoria na atualização de uma herança trovadoresca. Temos um certo fascínio pelo colonizador. Se Iracema se apaixonou pelo branco Martim, nos embevecemos depois pelos pianos franceses, pelas roupas de casimira e pelas luvas. Ficamos fascinados pelos gringos que trouxeram os jipes, uma bebida estranha, que não sabemos de que é feita e que montaram uma base aqui durante a Segunda Grande Guerra.

Hoje, algumas meninas ainda aguardam voos que chegam da Europa como um sonho de Cinderela que nunca se concretizará.
O deslumbramento é atávico e atrapalha a construção de um jeito que tenha ver com nossa ``matutice``, com nossa grossura e com nossos valores. Isto nos leva para o campo escorregadio da paródia e da caricatura, das quais tratam tão bem nossos humoristas.

Somos novidadeiros e iconoclastas. Adoramos passar um trator por cima de um prédio histórico e tratamos a memória como se fosse um sambaqui. Aqui ela não é retomada e atualizada.

Antes, ela se transforma em camadas que pisamos e negamos, até que venham as escavações e mostram os cacos do que fomos e poderíamos ter sido se não tivéssemos triturado tudo em nome de um ideal de progresso que não se sustenta.
Complicado viver no Ceará. Pensar a cultura, mais complicado ainda, tamanho o vaivém a que somos impostos pela mídia, pelas políticas culturais equivocadas e pelo aparato de uma incipiente Indústria Cultural.

Não se trata de querer encontrar vilão. Somos todos culpados. Ficamos quietos quando devíamos gritar e somos cúmplices da nossa sujeição.

Uma panorâmica mostraria momentos importantes, como a Padaria Espiritual, quando conseguimos nos antecipar, em 30 anos, aos pressupostos modernistas que viriam à tona com a Semana de Arte Moderna, em 1922.
Podemos pensar na religiosidade sertaneja que nos deu o padre Ibiapina, matriz das prédicas do Conselheiro e da prática do padre Cícero. Estivemos presentes ao romance social dos anos 1930. Combatemos as oligarquias na Revolução de Outubro, deste mesmo ano, para depois criarmos outras oligarquias.
Também fomos fortes com movimentos como o Clã, a Scap que revelou Aldemir e Bandeira, o Pessoal do Ceará que ainda hoje cantamos (vem um disco lindo da Mona Gadelha por aí, chamado Praia Lírica). Enfim tivemos picos e muitas baixas. Demos o que falar. Fomos importantes e nos esvaziamos.
Esta constatação não é nostálgica. O melhor está sempre por vir. O que é verdadeiro é que não soubemos construir algo que tenha impacto na cena nacional ou que vá além da ditadura do mercado, que se insinue pelas frestas, como algo inovador, contestador e forte.
Parte disso tudo se deve à política dos editais, uma forma de domesticar o impulso crítico de uma geração que vive das migalhas de uma legislação questionável. No que se refere às construções teóricas, vamos dos cronistas, interessantes pelas informações que trouxeram, aos impressionistas.
Pode-se pensar num diálogo com uma história cultural que vai nos levar a Canclini e Barbero, mas nem tudo se reduz às hibridações e aos sincretismos (Canevacci). Temos especificidades que precisamos compreender melhor. Sem futurologia, estamos perplexos diante dos novos rumos que se antecipam.

Não sabemos como vai ser. Provavelmente, ainda embarcaremos, por algum tempo, nas muletas teóricas que servem como panacéias. Enquanto isso, no dia a dia, no trabalho calado e sem refletores, a tradição tece sua trama, o hoje se afirma com suas ``gambiarras`` e vamos em frente, aos trambolhões, porque não se pode voltar atrás quando se está com os pés na estrada.


Gilmar de Carvalho, jornalista e professor do Departamento de Comunicação Social da UFC

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Homenagem a Cláudio Pereira



Zeca Zines presta uma justíssima homenagem, ao Cláudio Pereira, querido por todos os artistas e culturais cearenses das mais diversas áreas. Na década de 70 foi residir na Beira Mar vizinho ao Bar do Anísio, e sua casa sempre de portas abertas era frequentada por artistas como Ednardo, Fagner, Belchior, Rodger Rogério, Brandão, Teti, Augusto Pontes, (outro agitador cultural que também se foi no ano passado), jogadores de futebol, jornalistas.

Por ter o vital espírito agregador de juntar todas formas de culturas artísticas em momento muito difícil da política brasileira, Cláudio Pereira, foi perseguido pelo sistema militar vigente, foi preso diversas vezes, perdeu empregos, mas nunca perdeu seu bom humor e a forma muito especial de ver com esperança as pessoas e o mundo.



A cultura do Ceará perdeu dia 12 de maio de 2010 a energia e o espírito gregário de Cláudio Pereira. Produtor, gestor e principalmente "agitador" cultural, Cláudio prestou vasta contribuição a vários setores das artes cearenses. Sem nunca escrever um livro, pintar um quadro ou compor uma canção, Cláudio Roberto de Abreu Pereira prestou uma enorme contribuição à literatura, ao teatro, às artes visuais e à música do Ceará.

Agregador de artistas, incentivador de talentos, mentor e realizador de múltiplos projetos, o jornalista e produtor, que se despediu na madrugada de ontem, aos 66 anos, vítima de infecção generalizada, foi um dos nomes centrais para o cenário cultural cearense, da década de 60 à atualidade.

Um longo período, durante o qual Cláudio, nascido em Columinjuba, Maranguape, e conhecido pelas convicções políticas, atuou em diversas frentes: do Grupo Universitário de Teatro e Arte - Gruta, criado por ele na mobilização estudantil nos anos 60, à produção de eventos e às participações em programas de TV, em tempos mais recentes. Passando pela contribuição direta na gestão cultural, na Fundação de Cultura da Prefeitura de Fortaleza, que ajudou a fundar em 1985 e dirigiu ao longo da maior parte da década seguinte.

Estudante do Liceu do Ceará, onde já produzia jornais e articulava eventos de cultura, foi preso e torturado durante a ditadura militar, como registrou em entrevistas. Formado em Direito, trabalhou como jornalista, escrevendo para diversos veículos. Foi funcionário do Banco do Nordeste, cargo do qual, segundo relatos de amigos, se aposentou após o acidente, em 18 de novembro de 1973, que o deixou em uma cadeira de rodas.

"O Pereira era onipresente, tava em muitos lugares ao mesmo tempo. Em uma noite ia a cinco, seis eventos, mesmo de cadeira de rodas", recorda o compositor e ator Rodger Rogério. "Fazia as caravanas culturais nos anos 60, levando artistas de Fortaleza pra Sobral, pro Cariri, até pra Argentina, pro Chile... Ele já tinha página em jornal em 64, 65, por aí, e divulgava os artistas cearenses. Deu uma contribuição muito grande pra música, pro teatro, pras artes de uma maneira geral", desfia Rodger Rogério compositor do Pessoal do Ceará.

"O Cláudio foi o grande animador e a grande referência intelectual da nossa geração, junto com o Augusto Pontes. Eles não se afinavam, mas foram gurus de uma mesma geração", aponta Alano de Freitas, artista plástico e compositor. Uma missão que Pereira seguiu cumprindo, apesar das adversidades.

GILMAR DE CARVALHO - professor e escritor.

O grande legado do Cláudio foi a agitação, condição que ele levou às últimas consequências de estimular as pessoas e fazer com que elas criassem e interferissem no marasmo da cidade. Desde o final dos anos 80, esteve presente em quase todos os movimentos culturais. Sempre me impressionou sua vitalidade, sua energia e sua vontade de viver.

FRANCIS VALE - cineasta.

Fortaleza perdeu uma das pessoas mais importantes no campo da cultura nos últimos 40 anos. Lembro que nos anos 60, fundou o Grupo Universitário de Arte da UFC. Organizou, ainda nos anos 60, um importante Festival de Música. Ele implantava em Fortaleza as mesmas ideias de grupos como o "Opinião" e dos Centros Populares de Cultura. Outro grupo que Pereira fundou foi o Cactus, um grupo musical que trouxe à cena Nonato Luiz e Rodger Rogério.

AUTO FILHO - Secretário da Cultura do Estado.

Cláudio Pereira era um ativista do partido da cultura, foi diretor do MIS-CE, secretário da Cultura de Fortaleza e contribuiu para o desenvolvimento do setor. Soube usar, ocupar e viver a cidade, como poucos. A cultura cearense lamenta a sua morte.

DALWTON MOURA
Reporter do Diário do Nordeste

O "DOM QUIXOTE" DA CULTURA

A relação de Cláudio Pereira com os jornais nem sempre foi cordial, nos 12 anos em que ele dirigiu a Fundação Cultural de Fortaleza, até maio de 1998. As críticas à sua gestão, prolongada ao longo de vários mandatos, eram inúmeras.

Cláudio rebatia muitas, mas concordava com outras. Na verdade, Pereira sempre foi um agitador cultural. E nunca teve nem dinheiro, nem poder suficiente para levar à frente seus inúmeros projetos.

Mesmo assim, fez muito pela cultura de Fortaleza, também quando dirigiu a Funcet.
Sua demissão do órgão o deixou decepcionado. Cláudio não aceitou bem o fato. E saiu atirando.

Em entrevista ao Diário do Nordeste, deu uma velha e surrada desculpa: estaria saindo para tratar de problemas pessoais. Na verdade, Pereira estava sendo "fritado" pelo prefeito Juraci Magalhães.

Na mesma entrevista, Pereira revelou publicamente o câncer do então prefeito, notícia desmentida na ocasião pela assessoria do político, mas logo confirmada. Cláudio estava comovido durante o desenrolar da entrevista, realizada em seu gabinete na Funcet, em maio de 1998.

"Minha decisão vinha sendo amadurecida há meses, mas com a doença de Juraci - o prefeito tem câncer - resolvi recuar", disse. Na verdade, foi abandonado e seu processo de desgaste avançava a passos largos.

Acuado, deixou o cargo. Ressentido..Pereira foi, na verdade, um "Dom Quixote" da cultura. Bateu em várias portas, de chapéu na mão, em busca de verbas para tocar seus projetos. Moveu moinhos de vento. Foi chamado pejorativamente de "animador de quermesses". Até gostava. Pois, para ele, o mais importante era a cultura. Nunca escondeu o fato da falta de verbas e apoio para a área.

A comparação com o então secretário Paulo Linhares veio logo. Só que o governo Tasso Jereissati investiu mais no setor. E Juraci, não. Na verdade, debatiam-se, então, as políticas culturais postas em prática tanto pela Secult quanto pela Funcet.

Existia, de fato, uma política cultural no Estado? Ou apenas uma bem pensada estratégia de divulgação do Estado através da cultura? As discussões envolviam artistas, gestores e jornalistas e costumavam ser acirradas.

Cláudio Pereira, o "primo pobre", levantou várias bandeiras na periferia de Fortaleza, aproveitando festas como o Carnaval e o São João. Festas juninas e o pré-carnaval, hoje estruturados, devem muito ao seu trabalho. Instituiu ainda festivais de teatro e de vídeo e os prêmios Paurillo Barroso e Eduardo Campos. Todos criados por leis municipais.
Hoje, jogados para baixo do tapete.

Pereira sempre repetia uma frase nas suas inúmeras entrevistas. "É até um lugar comum - dizia - mas sem investimento em cultura e educação vamos permanecer no estágio de subdesenvolvimento em que nos encontramos".

Estágio em que, ainda hoje, continuamos, apesar de alguns avanços conseguidos nos últimos anos. Um debate que, tão comum naqueles anos, deveria ser retomado.

JOSÉ ANDERSON SANDES
Editor do Caderno 3 - Diário do Nordeste

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A SAIDEIRA FICA PRA DEPOIS
Jornal O POVO
Alinne Rodrigues

Era dia 12 de setembro. O ano, 1982. No Teatro do Ibeu, Gilmar de Carvalho se preparava para a estreia do seu O Dia em que vaiaram o Sol na Praça do Ferreira.

``Estas são as pessoas que escrevem ou escreveram a verdadeira história do Ceará, no que ela tem de mais autêntica``, dizia um personagem no palco, enquanto apresentava Zé Tatá, Siri e Cláudio Pereira, ``o aleijado que não se manca``.

No espetáculo, como na vida do jornalista, o que dava o tom era a fuleiragem. Ainda solteiro, em uma viagem de carro, sofreu um acidente entre Recife e João Pessoa. Foi desacreditado pelos médicos, mas, obstinado, conseguiu reabilitar parte dos movimentos e se locomover com a ajuda de uma cadeira de rodas.

Nunca perdeu o bom humor. ``Quando eu nasci, caiu o neofascismo na Itália, e, logo em seguida, caiu a Ditadura Vargas. Então, acho que nasci muito no astral da liberdade``, disse, oito anos depois daquela estreia, em entrevista ao O POVO.

Liberdade essa que Cláudio honrou, depois de uma vida de boemia, aos 65 anos, se foi sem pedir a saideira.

Filho de uma família imensa, a dos Abreus & seu sobrenome por parte de mãe &, ele não seguiu a tradição: teve 23 tios, 11 irmãos, mas nenhum filho.
O amor, no entanto, não lhe faltou. Casou-se, em 1979, com a professora Martine Kunz. "Eu tenho uma tese de que o amor é um coquetel que envolve o querer bem, depois o gostar, se sentir bem com a pessoa, respeitar, o companheirismo, e tem que ter tesão, porque, senão, não tem graça``. Foi assim com Martine até os últimos dias.

Nome-chave para a cultura cearense, Cláudio Pereira começou sua militância bem jovem, na década de 1960. Reunia os amigos do Liceu um deles, Fausto Nilo e colocava todo mundo para tocar. Organizava festivais por aqui com Fagner e outros tantos nomes ali ainda desconhecidos e depois dava de excursionar com todos os eles. Das viagens, veio o Pessoal do Ceará. A união não era somente artística. Com Fausto, ele fundou jornais e participou do movimento estudantil. "Fui preso várias vezes, fui muito torturado``, revelou na mesma entrevista.

Em 1985, quando começavam as primeiras conversas sobre a criação de uma secretaria de cultura, ele não acreditava. Era uma utopia. Naquele mesmo ano, acontecia a primeira eleição direta para prefeito pós-ditadura. Cláudio, de tão engajado, mantinha, na própria casa, um subcomitê. No entanto, seu candidato, Paes de Andrade, perdeu a disputa. Vencedora nas urnas, Maria Luíza Fontenele, primeira mulher eleita pelo Partido dos Trabalhadores para comandar uma capital de Estado, acabou convidando o jornalista para integrar sua equipe.

SUPERAÇÃO EM MOVIMENTO

Em sua "cadeira voadora", Cláudio Pereira espalhou pela Fortaleza, que cresceu e fez crescer, uma série de exemplos positivos, convidando a cidade a se experimentar de novas formas, superando limitações e obstáculos, desde os físicos aos ideológicos

Maria Luiza Fontenele especial para O POVO

Ao redigir este depoimento recebi várias ligações, todas de pessoas querendo dizer da sua dor, ressaltando, outrossim, a figura extraordinária de Cláudio Pereira, pela amizade, pela sensibilidade e acima de tudo, pela sua tenacidade em superar limites.

Cláudio, na sua juventude, marcou a história do Ceará junto aqueles que, na década de 1960, buscavam ``tomar os céus de assalto``. Ele era, sem dúvida, um contestador cheio de boemia, criatividade e irreverência. Dizem que, numa tentativa de invasão da Polícia ao Estoril (em busca de maconha) ele sugeriu: "Recebamos os policiais com palmas`` - ato que desarmou a caçada. Ao sofrer acidente que lhe deixou tetraplégico, fez da limitação a marca da superação. Ao atrair apoios, extravasou o seu espírito solidário. Não discriminava, acolhia, ousava.
Com esta roupagem abraçou a proposta de Presidente da Fundação de Cultura e Turismo da Administração Popular. Agigantou-se na tarefa de fazer de cada canto da Cidade um espaço para a arte, para a cultura e no esforço de amealhar recursos no sentido de assegurar projetos inusitados no âmbito da diversidade, como o de combate à discriminação aos portadores do vírus HIV, com a distribuição de preservativos, num tempo de pavor a aids.

De igual forma mostra a sua tenacidade ao transformar o local que, no período da ditadura fora dependência de tortura, na sede da Fundação Cultural com shows, espalhando sons pelos jardins do Paço Municipal. Cláudio era essa pessoa incansável quando o assunto era quebrar preconceitos, romper barreiras e garantir para todo artista um lugar ao sol.

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